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Somente dois tipos de pessoas pedem intervenção militar: os oportunistas e os ingênuos. Você pertence a algum deles?

 

Mais uma vez, em uma crise, parte da população clama às forças armadas uma intervenção. Uns a chamam de intervenção constitucional e, no auge do vexame, trazem na voz chorosa artigos da constituição que justificam o pedido de socorro. No entanto, a constituição não prevê intervenção, se isso ocorrer, o nome certo é golpe.

De onde vem este embrião golpista, este fantasma fardado que ronda o imaginário dos submissos cidadãos de verde amarelo? Será que no subconsciente nacional existe um fetiche ufanista de um capitão, estilo Nascimento, que acalora os sonhos e ruboriza a face das recatadas e recatados do lar? Ou será que o militarismo é tão presente em nossa história que o medo de guiar a si mesmo sempre faz com que os incompletos cidadãos tenham que recorrer a um herói?

Um breve histórico dos militares e sua participação na política.

O exército brasileiro considera simbólica a data de 19 de abril de 1648 como sua fundação, essa data remete à união de brasileiros para defender (dos holandeses) o território nacional. A criação da Guarda Nacional, em 1831, traz uma mudança no comportamento militar. Tida como uma força para combater internamente os inimigos, deixava ao exército o combate internacional. A Guarda nacional nasce para defender o latifúndio e as elites, seus inimigos são as revoltas populares que pipocaram, nesse século, desde a Confederação do Equador à Revolução Praeira. A Guarda Nacional perde força com a guerra do Paraguai (1864-1870), que coloca para sempre o exército em evidência e ligado à política.

Nesta primeira etapa, o exército tinha um caráter mais progressista se comparado com a Guarda Nacional. A deposição de D. Pedro II é um bom exemplo disso, é também um bom exemplo de como trocar a gerência do país pelas armas. O exército vai gostar e esta prática se tornará hábito. Na jovem República da Espada não há espaço para populares, já em Canudos e depois no Contestado o vermelho do sangue dos miseráveis tingirá para sempre as fardas engomadas.

Nas três primeiras décadas do século XX, de costas para o operariado, o exército empolga os setores dissidentes das oligarquias rurais através dos tenentes e leva ao poder Getúlio Vargas, empossado de armas nas mãos. O novo governo se apoia no exército para levar a cabo seu projeto de aliança entre a burguesia industrial e a velha oligarquia agrária, aquela mesma contra a qual a revolução de 1930 lutou.  Os setores do exército rebelados por esta situação, agremiados na ANL, foram sufocados pela ala reacionária dentro dos quartéis. O exército reafirma seu ideal sagrado de combate ao comunismo. Com o suposto surto de comunização das forças armadas, as elites, sob o lema da honra e contra o demônio comunista, dão o golpe de 1937. Mais uma vez, o guarda dos interesses das elites usa verde oliva.

Com o fim da ditadura do Estado Novo em 1945, o país tenta levar a cabo seu projeto democrático, uma democracia que não duraria muito. Novamente, as elites, preocupadas com a aproximação das camadas populares, ressuscitam em plena década de 1960 os fantasmas do passado. Esses fantasmas eram o do perigo comunista que tomava corpo com as reformas propostas por João Goulart. Imediatamente, a mentalidade tacanha toma as ruas. Em nome da família, de Deus e dos bons costumes as velhas ratazanas ocupam as ruas e se humilham em frente aos quartéis. As forças armadas têm o caminho aberto, mas dessa vez não viria só, teriam o patrocínio das elites e, nos meios de comunicação, desfilariam seus óculos escuros, enquanto escondiam suas mãos sujas de sangue.

Vladmir Herzog morto no DOI-CODI

A ditadura que veio do golpe (intervenção) de 1964 deixou de queixos caídos os mais sanguinários dos torturadores. Cassação de direitos, prisão, desaparecimentos, tortura, morte, censura e corrupção é o retrato daqueles amargos 21 anos que durou a ditadura.

 

 

 

 

 

 

 

 

O que faz uma parte da população se humilhar perante aos quartéis em pleno século XXI pedindo intervenção?

A questão é complexa e a resposta não é simples. Porém, nas mesmas bocas que carregam a graxa dos coturnos lambidos há pistas de respostas. Será que as faixas pedem o que pediam as faixas de cinqüenta anos atrás? “Xô comunismo” “pela família” “intervenção, já!” é o que se vê à beira das estradas.

É importante lembrar que em 1971 ocorre uma reforma educacional, sua pretensão é de moldar as mentes contra o comunismo. Os símbolos nacionais tendem a encobrir a desigualdade abissal na sociedade. Uma famosa passagem do então ministro da Educação e Cultura Jarbas Passarinho é categórico ao afirmar ao presidente Médici que:

“Vossa Excelência não proporá ao Congresso Nacional apenas mais uma reforma, mas a própria reforma que implica abandonar o ensino verbalístico e academizante para partir, vigorosamente, para um sistema educativo de 1º e 2º graus voltado para as necessidades do desenvolvimento. […] em uma palavra: é o que Vossa Excelência preconiza: a Revolução pela Educação.” (PASSARINHO, 1971: 15).

Esta mistura de repressão com formação educacional que visa não a formação do ser humano, mas o desenvolvimento pode ser a chave para se compreender a aberração políticas que se vê. Enquanto o resto do mundo grita por liberdade, no Brasil se grita intervenção. Pessoas apóiam a greve e ao mesmo tempo intervenção militar, o cúmulo da inocência? Ou o velho oportunismo rapineiro de sempre? Obviamente as duas coisas estão acontecendo ao mesmo tempo, resta agora separar quem é quem.

Enquanto isso, o Brasil segue com sua democracia cambaleante, quase ferida de morte. Por que não aprofundar a democracia ao invés de erradicá-la? A democracia é a forma de corrigir os erros do passado e do presente, jogá-la fora significa abrir mão do próprio destino. Uma alto-flagelação que não deve ter mais espaço neste país, um país multicolorido onde o verde e o amarelo são duas cores entre tantas, um jardim florido que não podemos deixar o asfalto frio e morto encobri-lo mais uma vez.

Famílias nunca puderam enterrar seus mortos.

About Rafael Pires de Mello

Rafael Pires de Mello é formado em filosofia pela UFPR, gosta de inutensílios como cinema,literatura,música e é claro o maior de todos, filosofia. Tem a tendência de chorar com música romântica quando bebe demais.