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Sete motivos para ser contra a reforma do Ensino Médio

Encaminhada pelo governo federal no dia 23 de setembro por meio de uma medida provisória (MP), a proposta altera trechos da Lei de Diretrizes e Bases da Educação (LDB) para adotar, entre outras coisas, o turno integral e o ensino profissionalizante. Além disso, a medida promove um enxugamento das disciplinas obrigatórias, que atualmente são 13, aplicando uma metodologia de ensino por módulos temáticos escolhidos a critério do aluno e segundo os interesses profissionais.

Para promover a reforma e justificar a urgência da implementação das novas medidas, o governo argumenta que a postura está relacionada ao resultado do ensino médio no Índice de Desenvolvimento da Educação Básica (Ideb), que ficou em 3,5 no ano passado em relação às redes estaduais. A meta estipulada era de 4,0. No caso das particulares, o resultado ficou em 5,3, também abaixo do horizonte previsto para o setor, que era de 6,3.

No entanto, apesar do discurso mirabolante do governo Temer, a MP 746 trará graves consequências ao já sucateado ensino médio brasileiro.

1) Falta de discussão com profissionais da educação

Quem entende mais a realidade das salas de aula do que os profissionais que trabalham nelas?

A MP proposta por Temer e o ministro da Educação Mendonça Filho não foi debatida com a sociedade nem houve um diálogo com os movimentos sociais da educação. Trata-se de um tema de grande relevância social, tem importância para a vida de milhões de pessoas das atuais e futuras gerações. Há um consenso de que mudanças estruturais na educação, especialmente no ensino médio, são necessárias e exigem ampla, responsável e qualificada discussão na comunidade escolar e com a sociedade em geral na busca de construir consensos possíveis para efetivar mudanças necessárias. Movimentos e organizações que defendem a Educação, em especial, a Educação Pública, com qualidade socialmente referenciada para todos e todas, não foram ouvidos e muito menos consultados durante a construção dessa Medida Provisória.

2) Qualidade dos professores

Enquanto o Plano Nacional de Educação (PNE) estabelece que é preciso garantir que todos professores e professoras da educação básica possuam graduação na área de conhecimento em que atuam, a Medida Provisória 746 passa a permitir que profissionais com “notório saber” possam dar aulas de conteúdos de áreas afins à sua formação. Isso significa que profissionais que sabem “na prática” sobre um conteúdo formativo profissional poderão dar aulas para os alunos do ensino médio. Como consequências poderemos ter professores sem didática, que simplesmente não sabem ensinar, profissionais que não tiveram a base da licenciatura, que podem não ter as capacidades necessárias para lecionar e para lidar com os problemas de sala de aula, ou seja, pode ser “um estranho no ninho”.

3) Queda na qualidade do ensino

Se aprovada a MP ficarão obrigatórias somente as disciplinas de português e matemática em parte do ensino médio. Trata-se uma medida para o empobrecimento cultural e educacional do currículo escolar, uma vez que todas as demais disciplinas estarão relativizadas.

Todas as formas de expressões lúdicas perdem espaço com essa MP. Contrariando até mesmo a Constituição Federal, em seu artigo 208, em que se estabelece o dever do Estado para com a Educação, determina-se a sua garantia por meio do acesso aos “níveis mais elevados do ensino, da pesquisa e da criação artística”. Antes previstas a todas as etapas da Educação Básica, a MP termina com a obrigatoriedade do ensino de arte e de educação física no Ensino Médio. Além disso, as disciplinas de Filosofia e Sociologia podem desaparecer completamente dos currículos.

O ensino de línguas também fica prejudicado. Até agora, a LDB estabelecia a obrigatoriedade da língua estrangeira, mas o idioma era escolhido pela própria comunidade escolar; com a MP, o inglês passa a ser a única língua estrangeira compulsória.

4) Desemprego

A consequência é a diminuição de vagas para profissionais de educação física, artes, sociologia, filosofia e professores de espanhol. A consequência serão centenas de milhares de profissionais migrando para a iniciativa privada, e essa com certeza não vai suprir a demanda. Pra termos uma ideia, só em educação física, mais de 40 mil novos professores se formam todos os anos no país. Assim, os profissionais que não conseguirem aulas no ensino público vão engrossar as estatísticas de desemprego no Brasil.

5) Mais desemprego – Estudantes

Com relação a expansão da carga horária, a reforma prevê instituir política (mas na verdade é programa) de repasse de recursos da União diretamente às escolas que implementarem o currículo mínimo e o ensino de tempo integral.  Pelo texto da MP as escolas podem decidir se vão instituir o ensino médio em tempo integral, que terá sete horas de aulas por dia. Na prática os alunos ficariam na escola o dia todo, as aulas noturnas seriam extintas nestes colégios e, os milhares de estudantes que trabalham durante o dia para ajudar no orçamento da família, ficariam desempregados.

Segundo o Ministério do Trabalho, em 2014 mais de 400 mil jovens foram colocados no mercado de trabalho por meio de programas de Jovens Aprendizes. Nesse sistema os estudantes frequentam os programas de aprendizado em um turno do dia, trabalham quatro horas em outro e cursam o ensino médio à noite. Com a obrigatoriedade do ensino médio em tempo integral milhares de jovens aprendizes também podem ficar desempregados.

6) Os colégios terão capacidade técnica e orçamentária para aplicar o ensino profissionalizante?

Uma das intenções da MP é instituir o ensino profissionalizante no ensino médio. Para isso as escolas precisarão ter, além de profissionais qualificados, laboratórios para as aulas práticas. Mas será mesmo que os colégios terão condições para comprar materiais adequados aos laboratórios de Química, Física, BIologia e informática? O investimento é alto. E o professor que para ter um salário digno e trabalha em mais de uma instituição e com as mudanças deverá ser exclusivo terá um salário digno para essa nova tarefa?

É possível que os colégios das grandes cidades consigam montar laboratórios adequados para o ensino profissionalizante, mas e os das cidades menores? É provável assim que haja uma nova migração de jovens para os grandes centros urbanos em busca de um ensino médio de “qualidade”, seria um novo êxodo rural?

7) Os colégios particulares podem ficar mais caros

Se aprovada a MP 746 aumentará significativamente o valor das mensalidades escolares do ensino médio na rede privada em função do aumento da estrutura necessária para a implantação com qualidade desta nova legislação. Isso pode significar uma migração de alunos para o ensino público, fato que pode ter graves consequências no já sucateado sistema público de ensino.

About José Pires

É Jornalista e editor do Parágrafo 2. Cobre temas ligados à luta indígena; meio ambiente; luta por moradia; realidade de imigrantes; educação; política e cultura. É assessor de imprensa do Sindicato dos Professores de Ensino Superior de Curitiba e Região Metropolitana - SINPES e como freelancer produz conteúdo para outros veículos de jornalismo independente.