Coluna Filosofia Di vina
Texto 1
Uma mentira contada várias vezes se torna verdade?
A percepção do mundo sempre foi uma discussão filosófica das mais acaloradas. Desde a antiguidade, pensadores debatem o tema. Em 2018 há uma novidade que consiste em ser um verdadeiro simulacro da realidade: O mundo digital. Como entender este fenômeno novo que vem mudando o paradigma social na era pós-verdade?
Propaganda é a alma do negócio
As redes sociais têm como principal financiador a publicidade dirigida. Por meio das curtidas e comentários dos usuários se traça um perfil de gosto através do qual se dirigem toda a publicidade. Por exemplo, se tenho um gosto musical particular, os anúncios voltados para meu perfil aparecerão prioritariamente em detrimento dos outros que não combinam com este gosto. Como isso ocorre? Através de algoritmos. São eles os responsáveis em demonstrar meus comportamentos na rede social, se prefiro mais vídeos, textos ou fotos. Por meio dos algoritmos é possível saber o que me agrada ou desagrada mais, este cálculo é feito mediante as interações entre os usuários.
A conta é complexa e o número de informações veiculadas é colossal, em números um usuário recebe em média 1500 posts, mas dá mais atenção a pelo menos 20% deles. A partir daí ocorre uma atualização do que agrada ou desagrada um usuário. Através das regras de categorização da própria rede se tem uma “time line” exclusiva para você.
O uso político disso também é possível, a Cambridge Analytica entendendo a alma do negócio começou a direcionar os perfis para determinados tipos de conteúdos, utilizando uma complexa rede que permitia identificar pessoas mais propícias a acreditar em notícias absurdas. Os posts de iscas versavam sobre coisas diversas, porém, difíceis de acreditar como teorias absurdas. Com isso se teve um levantamento confiável das pessoas que tinham uma tendência a acreditar mais, de modo geral um perfil com pouco hábito de leitura e de baixa resistência publicitária.
A maneira mais eficaz foi o de prender pela emoção. Até então nenhuma novidade, apelos sentimentais são utilizados na política há muito tempo. Os resultados foram os escândalos do “BREXIT” na saída da Reino Unido da União Europeia e a campanha de Donald Trump nos E.U.A.
E no Brasil?
Por aqui o caldo já estava pronto. Desde 2013 as manifestações de rua foram convertidas em manifestações, primeiramente anti-governo, depois anti-PT. A mídia tradicional teve um desempenho importante, principalmente nas coberturas ao vivo das manifestações pró impeachment. Neste contexto surge o MBL, grupo financiado por dinheiro norte americano (conforme apuração da agência A Pública) que começa a bombardear as redes com notícias falsas, vídeos editados e imagens descontextualizadas.
A insatisfação popular, somada com o esfacelamento da direita liberal tradicional, as notícias bizarras e falsas reacendem velhos sentimentos racistas e reacionários da sociedade, velhos preconceitos tomam a cena deixando o caminho aberto para um candidato salvador da pátria, neste caso a figura nebulosa de um capitão reformado do exército que surge como novidade, apesar de estar na vida pública há 28 anos.
A campanha do candidato, que vem se construindo há pelo menos cinco anos, é vitaminada com as dicas de internet e mídia sociais elaboradas por Steven Bannon, o braço direito de Trump!
Após a rede social Facebook excluir centenas de perfis falsos e redes de fake news, neste período eleitoral, as atenções se voltam para o Whatsapp, por ser a principal ferramenta de comunicação instantânea. Nele o rastreamento de notícias falsas é mais difícil, porém, não impossíveis de fazer.
O jornal Folha de São Paulo, denunciou em 18/10/2018 o esquema de caixa 2 onde empresários bancavam a compra de pacote de mensagens difamatórias contra o candidato do PT. O montante de 12 milhões de reais é o que foi pago (até agora) para a criação de uma outra realidade, uma realidade que não está em contato com o mundo de verdade, mas ao contrário, coloca os próprios fatos reais sobre dúvida.
Uma experiência nos grupos de WhatsApp.
Por algumas semanas, frequentei três grupos de WhatsApp: “Bolsonarianos” “Bolsonaro 2018” e “Sargento Fahur”. Fui descoberto por um comentário infeliz que fiz sobre uma notícia falsa e fui excluído com um comentário “alguém exclui este retardado? Atenção ADM”.
Nos dias que fiquei pude ver de perto o nível das notícias, todas com endereços que não aprecem no Google, como Corvo News, Mídia Imparcial, Ceticismo político, Folha Política, Gazeta Social, Jornal Livre, Política na Rede e Radio Vox.
As notícias são diversas, com forte apelo emocional. Kit gay, homenagem a Pabllo Vittar no Dia Internacional da Mulher, marchas pró Bolsonaro com fotos editadas. Arquivos de áudio com conteúdo sobre fraudes nas urnas, resultado das eleições antes mesmo do começo das mesmas, filme de Jesus travesti dirigido por Jean Wyllys, fotos com montagens toscas. O que mais me chamou a atenção foi a do “Kit satânico” que o governo distribuiria. Neste kit se ensinava a fazer a tenebrosa magia das trevas. As pessoas recebiam com indignação, os comentários forjavam a ideia de que tudo está errado, temos que acabar com esta palhaçada. Todas as notícias vinham com o apelo “compartilhem sem dó” “o governo quer tirar do ar, compartilhem com urgência” “não nos calaremos, vamos compartilhar” e com certeza as pessoas distribuíam isso em seus grupos pessoais e familiares.
O interessante é que em todos os grupos havia números de celulares internacionais com códigos (662) (816) (111) (244). Nenhum brasileiro, portanto. Em um deles havia o perfil do próprio Bolsonaro, que provavelmente era perfil fake, mas que recebia mensagens de carinho quando aparecia com um bom dia, ou com a velha frase “Brasil acima de todos, Deus acima de tudo”.
A questão que fica é apenas uma: como alguém que tem um discurso de combate a corrupção pretende se eleger através da corrupção? Alguém que diz defender a verdade se eleger pela mentira? É esta a novidade? Este é o país que todos sonham? Caixa dois não é mais crime? Abaixo se encontram links úteis para quem quiser se aprofundar mais.
https://www.brasildefato.com.br/2018/10/03/uma-mulher-muculmana-no-reduto-de-bolsonaro/
Como denunciar:
https://www.tecmundo.com.br/internet/135204-denunciar-fake-news-facebook-no-whatsapp.htm
https://www.brasildefato.com.br/2018/10/06/artigo-or-tem-dedo-da-cia-nas-eleicoes-do-brasil/
https://resumo.com.br/sociedade/entenda-como-funcionam-as-fake-news-e-aprenda-identifica-las-8160/