Coluna Confortavelmente Enrockecido
Shelley Stewart nasceu na área rural de Birmingham em 24 de setembro de 1934, e sua vida pode ser resumida em uma frase: obstáculos a superar. Hoje ele é um empresário de sucesso, no entanto, quando criança, ninguém acreditava que seu futuro pudesse ser brilhante. Stewart superou uma infância empobrecida repleta de tragédias familiares. Aos cinco anos testemunhou seu pai assassinar sua mãe, Mattie C., com um machado. Mais tarde, vivendo com parentes, era espancado constantemente. Muitas vezes era chicoteado até sangrar e suas feridas recebiam doses generosas de sal, o que o fazia urinar de dor. Quando ele e seus irmãos foram devolvidos ao seu pai, ele foi forçado a dormir na varanda de casa, até que um dia decidiu fugir e ganhar a vida longe daquela tortura. Anos depois, quando já era um Dj famoso e financeiramente bem estabelecido, sustentou e cuidou de seu pai nos últimos anos de vida de seu carrasco.
Em 1949 Stewart conseguiu um emprego como repórter na rádio WBCO em Bessemer. Lá, ele começou a desenvolver a sua personalidade de locutor. Depois de se formar no colegial não conseguiu a bolsa de estudos que esperava. Na época, o diretor da universidade disse que ele não tinha o apoio familiar necessário para faculdade, embora tivesse as melhores notas. Precisando de um trabalho, Stewart entrou para a Força Aérea e serviu durante dois anos. Voltou para Birmingham em 1953 e conseguiu um emprego na rádio WEDR. Começou a ser chamar então de Shelley ” Playboy” Stewart. Seus programas, repletos de Blues e Jazz, ganharam rapidamente o público jovem, formado tanto por negros, quanto por brancos.
No início da década de 1960 suas transmissões focavam-se, além de rock n’ roll, nas lutas pelos direitos humanos dos negros de Birmingham, e serviam como um mecanismo de comunicação fundamental para jovens negros envolvidos em protestos de rua. Durante a primavera de direitos civis de 1963, Stewart se juntou a outras personalidades de rádio para transmitir mensagens codificadas para jovens manifestantes dizendo-lhes quando e onde marchas iriam ocorrer. Stewart e outras personalidades de rádio ajudaram o Dr. Martin Luther King Jr. na Marcha das Crianças pelas ruas de Birmingham.
Brancos contra a Ku Klux Klan em defesa da música negra
Em julho de 1960, Shelley “The Playboy” Stewart viveu o momento mais marcante de sua notável carreira. Em uma noite quente estava apresentando um show em Bessemer, quando recebeu um aviso do dono do clube: a Ku Klux Klan, temida organização racista, havia mandado 80 homens para atacá-lo. Os encapuzados cercavam o clube e ameaçavam invadir o local que ousava abrigar um Dj negro que tocava música negra para jovens brancos. Sem perder a calma, Stewart avisou à plateia – formada por 800 brancos – que teria de parar o show porque a KKK não o queria na cidade. Foi aí que o inesperado aconteceu. “Os jovens que estavam no clube se rebelaram”, disse Stewart, anos depois. “Eles saíram correndo do local e atacaram a Klan, lutando por mim. ” Depois de socos, paus e pedras, os racistas da KKK, acostumados a espancar negros e incendiar suas casas, saíram com o rabo entre as pernas, enxotados por centenas de jovens brancos que acreditavam no trabalho e na ideologia de um DJ negro. A simbologia do fato é forte demais: brancos lutando contra brancos, pelo direito de ouvir música negra. Uma história que só reforça o fabuloso papel do rock n’ roll de unir raças em torno de um objetivo comum.
Anos depois Brian Ward, em seu livro Just My Soul Responding, ressaltava que programas de rádio apresentados por negros como Shelley “The Playboy” Stewart, que transmitia muito blues, rock e jazz, trabalharam para destruir perímetros raciais por meio da criação e consumo de música. “Este foi um desenvolvimento comercial e cultural que muitos esperavam e alguns acreditavam que anunciou uma nova era das relações raciais.”