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Perfil | Giorgia Prates quer uma Mandata Preta na Assembleia Legislativa do Paraná

Por Paula Zarth

Foto: Divulgação

Mulher, negra, lésbica, suplente na Câmara de Vereadores em Curitiba, Giorgia Prates (PT) é a representação da bandeira de suas lutas e quer ocupar a Alep sem sair das ruas de periferia

A fotojornalista Giorgia Prates estreou na política partidária paranaense nas eleições de 2020, quando foi surpreendida por uma expressiva votação para a Câmara de Vereadores de Curitiba (obteve 3.582 votos pela Mandata Coletiva das Pretas, numa candidatura coletiva junto com Andreia de Lima, que nessas eleições de 2022 também é candidata a deputada estadual pelo PT, e foi eleita a terceira suplente pelo Partido dos Trabalhadores) e isso a impulsionou para agora disputar a ocupação dos espaços na Assembleia Legislativa do Paraná.

“Na Mandata Coletiva das Pretas isso foi muito maravilhoso. A gente teve um número expressivo de votos, não vou dizer que eu esperava tanto, mas acho que a gente conseguiu falar para as pessoas aquilo que era importante, levantar as pautas, que a gente precisa olhar pra isso, conversar. Deixando de lado todas as diferenças, as pessoas querem se somar, é isso que a gente aposta, no amor e na vontade de crescimento das pessoas pelo coletivo, trazendo essas pautas diferenciadas pra dentro da política e na vida da gente, para que a gente tenha uma vida melhor”, define.

Mas o que são as pautas diferenciadas?

Giorgia carrega suas pautas diferenciadas na própria existência: de mulher, que é mulher preta, uma mulher preta que é casada com outra mulher, que mora e sempre morou em regiões periféricas e que em sua profissão, como fotojornalista, é acionada por pessoas em situação de risco, para que sua câmera seja, então, medida protetiva contra as violências, principalmente as cometidas pelo que ela chama de “mão armada do estado”. Giorgia atua e defende com seu trabalho de visibilidade as pessoas que lutam por moradia digna e moram nas ocupações da grande Curitiba.

“Muitas vezes a gente chega nas ocupações sabendo que a polícia já está lá. A gente pede apoio para deputados, chega lá e apanha junto com os moradores e a gente não tem respaldo. São pessoas. Se elas estão naquela situação não é porque elas querem, porque elas gostam. Elas tentam o espaço para viver em paz, ter um lugar para colocar seus filhos, poder sair para trabalhar, viver uma vida como qualquer outro cidadão. Mas não elas têm isso, tanto por parte do governo, que coloca a mão armada do estado e as pessoas em risco, sob a violência total do estado. E também por parte de muitos, que não acompanham, mas vão lá tirar uma foto, pra dizer que estão ali. Isso é totalmente desleal com aquelas pessoas, que precisam ser vistas como pessoas, que estão ali lutando por um lugar de sobrevivência, que é o mínimo ali, porque aquelas pessoas acabam tendo nada para ter esperança, a não ser aquele chão, que acabaram de entrar, que começam a montar um barraco para chamar de casa. Isso é muito cruel. São pessoas que estão mais do que à margem, estão largadas sem qualquer política decente”.

A pauta racial, de gênero e de diversidade são o lugar de onde Giorgia olha e atua para a questão maior da luta pela efetivação dos direitos humanos. E então ela se apresenta também como uma opção para proporcionar, de fato, aos cidadãos uma atribuição básica do mandato de um deputado estadual e que ela entende estar sendo deixada de lado, que é a fiscalização para prover informação à população.

“Essa é minha primeira proposta, fiscalizar tudo o que um deputado estadual tem que fiscalizar, colocar tudo na mesa e levar para a população essa informação. A gente não tem informação do que realmente um deputado estadual pode fazer, verificar se as leis estão sendo executadas”, afirma, entendendo que o orçamento público pode ser melhor direcionado, especialmente para proporcionar melhoria nas moradias.

“A gente não pode mais permitir essa violência, que deixa marcas de todas as maneiras, é moral, é psicológica. Obviamente, se essas pessoas saírem dali elas vão ter que procurar outro lugar e novamente elas passam pela mesma situação e aquilo vai se repetindo. Hoje tem vários lugares com risco de despejo e ainda assim não surgiu nada, nenhuma nova política que faça isso cessar ou que dê minimamente o conforto para essas pessoas que possa ter alguma mudança. Eu acho que qualquer político que já ocupa esse espaço poderia estar fazendo esse trabalho e no mínimo informando a população sobre o porquê isso não acontece. Então entrando e sabendo como funciona, se não puder fazer, ao menos vou poder informar a população sobre como isso funciona. O porquê as pessoas ainda estão passando por isso sem nenhuma esperança de melhora”.

Quando puder alcançar a ocupação do espaço público de poder com sua Mandata Preta, que tem como lema de campanha ser a “Nossa Voz”, que a além da visibilidade racial e LGBTQIA+ defende também a causa animal como política pública necessária, Giorgia acredita que não conseguirá se afastar das ruas.

“Eu sempre me perguntei, se eu for eleita, se eu vou deixar as ruas. Eu acho que eu não consigo. Na verdade, pra mim é muito mais importante estar junto das pessoas, estar entendendo aquelas lutas, ver onde o direito delas estão sendo feridos do que qualquer outra coisa. Se a gente puder levar a voz dar pessoas que estão marginalizadas para o espaço de decidir políticas, de decidir questões, isso vai ser importantíssimo. Eu jamais vou deixar esses espaços de luta, de estar com as pessoas. É pra isso que é a política, ela é feita para as pessoas. Mas para isso elas precisam conseguir falar, apresentar suas problemáticas. Quando a gente tem muitas pessoas envolvidas somente com elas mesmas, a gente não tem nada”.

A barreira do racismo

Como uma mulher preta, Giorgia afirma que a principal dificuldade para a ocupação dos espaços políticos de poder é a barreira do racismo. Ela lembra que a Câmara de Curitiba cassou o vereador negro Renato Freitas. “A barreira do racismo é pesada sobre nossos corpos, e não mede esforços para tirar a gente dos espaços de poder e para não permitir que a gente ocupe esses espaços”, afirma, dizendo que apesar disso, o racismo não a deixa inerte. “Minha mãe me ensinou que a gente tem que carregar o que nos faz ir para a frente e o que nos faz temer a gente tem que saber superar”.

Giorgia acredita que atualmente as candidaturas pretas perderam o medo de se colocar para a disputa eleitoral. “A gente olhando pra trás a gente não via muitas candidaturas pretas se colocando, as pessoas tinham medo mesmo de se expor a esses caminhos, que é uma exposição. Mas também hoje tem aqueles que acham conveniente, as pessoas estão gostando de dizer que são pretas. Se uma pessoa se autodeclara preta e não é preta, imagina como é o caráter dessa pessoa. Se chega nesse ponto, não vai fazer bem para uma sociedade. Isso é uma coisa que me deixa muito tranquila, eu sei que as coisas que eu falo, a maioria das pessoas já me viu fazendo, vivenciando e vivendo”.    

Conforme dados do TSE, 44 mulheres de autodeclaram pretas em 2022, um crescimento de 126% com relação às últimas eleições para os parlamentos estaduais e federais, em 2018, quando 19 mulheres se autodeclararam pretas. Contudo, essas mulheres que se declararam pretas nessas eleições de 2022 representam apenas 8,2% das candidaturas femininas do estado do Paraná, sendo que 74% das candidaturas de mulheres no estado são de mulheres brancas.

O Parágrafo 2 que contribuir nessas eleições para a visibilidade das candidaturas de mulheres negras e pessoas indígenas.

 

 

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