Coluna Filosofia di Vina
Há cinquenta anos, também em setembro, de 1968 mulheres se reuniram para queimar seus sutiãs no evento que escolheria a “Miss América” em Atlantic City. Impedidas pela prefeitura as 400 manifestantes chocaram as estruturas de visão machista e conservadora nos E.U.A e inspiraram outras mulheres pelo mundo a queimarem também suas amarras, a queimarem seus sutiãs. Neste mesmo ano o clima era de revolução de costumes e mudança de protagonismo, as massas queriam gritar e as ruas se enchiam de jovens, cartazes e rebeliões. Um ano depois o mundo é novamente abalado pelo Festival Woodstock.
Em Curitiba, uma capital tradicional por ser a Tucanópolis de figuras conhecidas do reacionarismo e do conservadorismo, teve suas bases estremecidas pelos cantos das vozes femininas. Vozes que ecoavam pelo centro, em um ato histórico com milhares de pessoas no último sábado 29/09.
O “ELE NÃO” cantado por elas é simbólico. O ELE é a personificação de todo o atraso de um mundo arcaico e já sem bases reais. Elas gritavam NÃO e este “não” vêm desde as operárias mortas e presas na greve de 1857, passando pela luta das sufragistas, o incêndio e o “levante das vinte mil” de 1911, o maio e o setembro de 1968 até chegar em 2018, o mesmo “não”. O não à exploração, o não ao ódio, o não visão que coloca a mulher como ser humano de segunda categoria, o não ao retrocesso de quase cem anos de progresso na luta feminina.
O que o famigerado candidato do PSL conseguiu fazer foi inédito, diga-se de passagem, ele consegui unir as feministas que em sua maioria são do reduto universitário com as donas de casa e operárias, as ruas de Curitiba e do Brasil tinham esta mesma composição, jovens, senhoras de todas as idades e vivências afinadas em um só coro, em um só “não”.
Curitiba tremeu por ser um movimento espontâneo, pasmem: nem um carro de som, o barulho ensurdecedor do sábado era feito à moda antiga aos gritos orgânicos de uma massa incalculável de mulheres insatisfeitas que mostraram que a partir de agora, nenhum direito a menos, nenhuma violência mais.
O recado dado pelo coro assustador das vozes femininas foi esse, elas ensinaram que é ocupando as ruas que se mudam as coisas, em suas palavras de ordem diziam que “pela direita nem o PT” em uma alusão clara a uma possível reconciliação por vir.
A noite não retirou nenhuma delas das ruas, incansáveis reocupavam um espaço que sempre fora delas, o espaço de luta, além de mostrarem um alto nível de organização e uma extrema revolta. Durante a madrugada pelos bares da cidade alguém puxava um “Ele não” e rapidamente era acompanhado pelas centenas de pessoas dos bares ao redor, o fascismo não dormiu naquela noite.
Galeano nos brinda com uma frase clássica que exemplifica o sentimento de sábado: “Se não nos deixarem sonhar, não os deixaremos dormir.”