Por Mário Costa
Meus filhos são dois homens bonitos e fortes, educados e pais de família, o meu orgulho, bençãos, graças de Deus. Para traze-los a este mundo, que às vezes é uma dádiva noutras um fardo, nasceram de cesariana, num corte de uma extremidade a outra da barriga, frutos da árvore da criação brotados da junção de dois seres, do homem e da mulher, do amor que nunca tive e que tu me negaste.
Vivi alguns anos no interior do Paraná, trabalhando no campo com meu pai, arando, semeando e colhendo os frutos e as pragas. Filha da terra, menina do interior, de pele marrom, árvore pequena de raiz profunda, braços torneados pela lisa, branca como o céu e a tempestade, como o véu, sobre o sol que castiga e nutre e a chuva que nutre e afoga. Naquele tempo o amor era a pura inocência do beijo que toca suave e rasgante, manso e inquieto a boca dos poetas, que nos brinda os lábios, da uva colhida da videira com as mãos e amassadas com os pés, o vinho que embriaga a alma e o coração. Isto era o amor para mim, talvez ainda seja, mas, por alguns anos era um estranho, gélido, nauseante, ocupando um dos lados da minha cama.
Namoro, Casamento e Filhos eram coisas ainda distantes daquele mundico, da rotina repetitiva e monótona, plantar, semear, colher, sobre o sol e sobre a chuva e, mesmo com tanto verde ao redor, a esperança era parca. Nos sonhos de menina moça o rapaz que me tomaria como mulher seria como a brisa sobre os meus cabelos, sem força, calmo e tranquilo, puro. Como breves encontros furtivos me roubando o tempo e a percepção do espaço, cheio de brilho. Debruçava os pesares sobre o travesseiro e as preces ao pé da cama assim eram meus dias, até que um dia, num dia, conheci o Lourival aos 15 anos.
A vida com ele parecia repleta de cores vivas, daquilo que nunca tive, os bailes, a música, as luzes da cidade, o carmim e o perfume, e, ainda, junto com aqueles beijos, uma pessoa encantadora. Logo, fugi no dia de reis, carregando uma mala vazia para o moinho de vento. Apesar da rebeldia, do ato impensado, da fuga levando apenas um par de roupas e os chinelos, não tinha do que reclamar, Lourival me respeitava, parecia ser um homem direito, daquela terra viria colheita farta. Dormíamos juntos, claro! No entanto, ainda menina moça recusava suas investidas, dizia a ele “sou virgem e tenho medo”, no entanto, me afrontava dizendo “você não é virgem coisa nenhuma e um dia eu te pego, aí você vai ver”. Nunca o levei a sério, suas palavras, ou, ameaças veladas, que soavam apenas como besteiras e não passavam de brincadeiras. Entretanto, num dia, um dia, infelizmente, este dia chegou.
Numa tarde estávamos apenas eu e Lourival na sala de casa, sua mãe havia saído, após um mês morando juntos não havíamos transado ainda. Então aproveitando da oportunidade ele veio se achegando com os braços sobre mim com investidas insistentes e agressivas, pediu e, eu, neguei, não estava pronta. A imagem do homem bom e manso de coração despia-se lentamente sobre meus olhos, Lourival, me pegou com força pelos braços me jogando sobre o chão como um animal encurralado, jogou seu corpo sobre mim para não fugir enquanto debatia no chão tentando escapar daquele homem caído, só enxergava desgraça, se tivesse cordas amarrava minhas pernas, arrancou as roupas e, novamente, neguei, veemente, neguei. Ele continuou.
Mordeu o meu corpo segurando forte pelos braços com força, arroxeando-os, imprimia força, brutalidade, arrogância, uma besta cega. A todo custo tentei impedi-lo, não escutava uma palavra se quer, não tinha pena, compaixão e eu tentando fugir, não consegui, eu juro…. A sala parecia uma prisão, aquele momento um calvário, Lourival cada vez pior, com mais raiva, pôs-me de costas, abriu a cinta, a braguilha das calças tirou o pênis para fora e penetrou no meu ânus como se estivesse dominando um burro brabo, quando terminou, depois de tanta sujeira, levantou e foi embora. A violência daquele momento arrancou as pregas do ânus o sangue escorreu pela bunda, fiquei apática, sem sentir nada, vazia de sentimento, até achei que a culpa era minha. Sua mãe chegou e lá estava debaixo da mesa com as pernas recolhidas sobre a barriga e envolto sobre os braços em posição fetal numa poça de sangue. Ela perguntou “quem fez isto?”, não disse uma palavra, mas sabia que foi Lourival.
Permaneci com ele por 15 anos, separar-se após uma traição foi um presente. Ele me agrediu quando estava grávida provocando um aborto, noutra vez me deu um soco na nuca me derrubando num monte de bosta de vaca meus filhos acharam que estava morta, fiquei inconsciente por dois dias. Por anos permaneci ao lado de alguém que não me deu nada e levou quase tudo, minha saúde mental, meu útero, dessa árvore morta, deste homem, deste resto, troco de gente, apenas agradeço por meus filhos e ter me dado paz quando saiu da minha vida para nunca mais voltar. Isto não era amor.