17h, estamos no Brasil, em Curitiba. Nesta bela e bastante tranquila tarde de 5 de fevereiro de 2022, um pequeno grupo de pessoas, no máximo algumas dezenas, reuniu-se em uma pequena praça “Largo da Ordem” à porta da “Igreja do Rosário”. O clima ainda é um pouco caprichoso. Apesar da ameaça de chuva, as pessoas estão de pé no encontro.
É que pela causa vale a pena ficar encharcado
Eles estão lá por justiça; a de Moisés. Este jovem congolês de 24 anos que foi covardemente controlado por três brasileiros, amarrado e espancado até a morte, no Rio de Janeiro. Não que eu esteja fazendo toda uma história… Neste momento, Moïse gostaria de estar presente. Só para curtir a chuva. Seus carrascos não hesitaram em tirar esse prazer dele, essa chance.
Esta é a enésima vez que a violência inédita do racismo é trazida à praça pública. Meu irmão Russel e eu fomos convidados a nos juntar aos manifestantes. Fomos até lá acreditando firmemente que poderia ser um de nós, acreditando também firmemente que se não agirmos para que a vida das pessoas seja respeitada seja qual for sua origem ou sua cor, a barbárie do racismo nunca vai parar.
Slogans marcantes: “Justiça por Moïse!”, “Não normalize a barbárie!”, “Moïse presente!”, “Bolsonaro racista!” ou “Vidas negras importam!”. Uma sensação de “déjà vu”. Ai sim! “Black life matter!” Lembro-me vagamente de George Floyd agora. Sufocado até a morte, no meio da rua, por policiais racistas nos Estados Unidos.
Em todo o mundo ocidental, o homem negro não tem margem para erro. Um pequeno, um menor, e ele está pronto para ser enviado, brutalmente, para o outro lado. Quem faz o trabalho sujo afinal? Qualquer cidadão de boa vontade, quando não são policiais racistas que se encarregam disso. Todos trabalham para que o sistema mantenha sua selvageria.
Grite contra o racismo institucional…
Na sua fala, na ocasião, o secretário-geral da associação BOMOKO (uma associação de estudantes imigrantes africanos em Curitiba que se ajudam mutuamente), insiste no fato de que o negro pode ter todas as capacidades e qualidades do mundo, ele sempre é considerado um eterno trabalhador. O homem de cor que deve ser mantido na base da escada, nesta sociedade brasileira com forte temperamento racista.

(Crédito foto: Gloire (do lado do secretário geral de BOMOKO está um amigo de Moïse que morava no mesmo prédio que ele))
Nada mudou desde a época dos nossos ancestrais, meu irmão me disse. Sempre nos encontramos em praça pública pedindo a brancos racistas e incorrigíveis que parem de nos matar de acordo com sua boa vontade ou seu humor. Ele se pergunta, preocupado, mas com raiva, se gritar em praça pública ou se manifestar nas ruas será suficiente para nos fazer respeitar nos próximos dez ou cem anos. Precisamos urgentemente de outra estratégia mais dinâmica para proteger vidas Negras nessas sociedades ocidentais, capitalistas e racistas.
Tive a oportunidade de conversar com dois jovens (que desejam manter o anonimato) da associação “Organização Ato”, (a Organização Ato trabalha pela educação e por um mundo melhor) que fazem parte dos organizadores da manifestação. Sua ação defende, pelo menos, três pontos de vista.
O primeiro, eles sabem que Curitiba é historicamente uma cidade marcada pela narrativa de uma cidade branca e europeia e que tem forte tendência a esquecer as contribuições dos afrodescendentes em sua construção.
O segundo, pensam que a luta contra o racismo; a luta contra o fascismo e o capitalismo estão intimamente associadas. Além disso, segundo eles, no Brasil de hoje, a política pública do atual governo não está ajudando, criando mais desigualdades.
O terceiro, estatísticas do ano de 2019 dizem que no Brasil 78% das pessoas mortas por arma de fogo são negras. Isso mobilizou sua ação para lembrar ao mundo que uma vida humana é uma vida e que não tem cor. Também exigir que esses crimes baseados no racismo institucional e na xenofobia sejam punidos e, sobretudo, que o governo atue com o objetivo de criar um Estado mais justo e sem violências para as pessoas Negras brasileiras e imigrantes.
Eu vi o vídeo onde Moïse foi espancado até a morte. Primitivo. Todos nós já o vimos. É de uma violência colonial. O racismo é uma emoção, um sentimento tão bárbaro que nos torna completamente animais e cegos. Os três assassinos não tinham a menor ideia de que poderiam ter sido filmados em plena ação, em pleno século XXI. A idiotice é uma falta bem desagradável.
Em seus depoimentos à polícia, eles descrevem o jovem congolês, Moïse, como um alcoólatra e viciado em drogas que procurava problemas. De tal modo que ele merecia ser dominado, depois amarrado, depois espancado longamente e brutalmente, até a morte.
Até agora a chuva não impediu a manifestação. Muita coisa aconteceu, ao crepúsculo saímos da praça. A justiça é um prato que se come quente. Eu me diverti muito acompanhando o movimento pelas ruas. Gritos são lançados no ar. E eu, sendo o Cândido deste século, rezo para que esta ação seja bastante ouvida, e que Moïse descanse em paz, entre os milhões de vítimas do racismo.
Carlile Max Dominique Cérilia