A curva da bola venceu o goleiro Ricardo, do Flu, entrando na gaveta.
– Não dá para ir pela Rua Mauá, nem pela Itupava, Ubaldino do Amaral ou muito menos a Essenfelder, todas estão interditadas.
– Vamos pela Almirante Tamandaré, segue até a rodoviária e passando o viaduto do Capanema terá uma entrada à sua esquerda, faz o trajeto do Interbairros I. Sobe aqui! À direita, estou atrasado!
– Falando nisso, quem joga hoje?
– Coritiba e Fluminense.
Próximo das 20h24, as ruas foram tomadas pela multidão alviverde, a magnética vinha a pé, ônibus, carro e, pensando na sustentabilidade, de bicicleta. Regidos pela esperança de alcançar a liderança do campeonato a torcida do Coxa compareceu em peso ao Major Antônio Couto Pereira. Bandeiras em punho, buzinas e canções, este era o clima. Jogando em casa a confiança na vitória aumentava.
O Coritiba com um elenco sem muitas estrelas mas, segundo meu irmão “esforçado dentro de campo”, apresenta uma campanha regular. Com uma vitória em casa, dois empates fora, com saldo de gols positivo, a equipe soma cinco pontos e tem 66,7% de aproveitamento no campeonato. Vencer o jogo hoje significa assumir a liderança.
O momento que antecede o espetáculo percorria as ruas de Curitiba com o Paulinho guiando o “Celtinha” azul. O desafio era entregar o trabalho de conclusão de curso e para variar deixei tudo para os “45 do segundo”, porém sem acréscimos neste caso.
Confesso! Nunca fui um interessado por futebol, não conheço esquemas táticos, históricos, regras de impedimento ou posições dos jogadores. Dentro de campo, digo com toda a sinceridade, que não sei nem qual pé chuto. Era só canelada, chute de bico e por vezes amargurei o banco. Não posso nem dizer que cheguei ao gramado e, muito menos, a várzea. Se o futebol fosse uma religião, seria agnóstico. No entanto, arrisco alguns comentários, claro sem muita convicção, pertinência ou análises apuradas. Sou palpiteiro, técnico de bar, se não sei pergunto, o importante mesmo é participar da festa. Torço apenas pelo bom futebol.
Entretanto, meu irmão é fanático pelo Coxa desde pequeno acompanhava a todas as partidas. Viu em pleno “Maraca” o seu time erguer a taça do Campeonato Brasileiro, em 1985, contra o Bangu. Foi à primeira equipe do Paraná a vencer a competição, de acordo com meu irmão “era um bom time”. Na época o presidente do time era Evangelino da Costa Neves, sogro do atual camisa 10 Alex.
Chegamos a tempo na faculdade e entreguei o bendito, ufa! No caminho de volta pedi para me deixar pelo bairro São Francisco, pois tinha outros afazeres, entretanto, achei deselegante tratá-lo como táxi. Em retribuição fomos tomar uma béra e assistir ao jogo no Lusitanos.
O Lusitanos é um bar de velho, ou melhor, à moda antiga, que serve carne de onça, bolinho e cerveja gelada, localizado no Juvevê próximo ao Mercadorama, esta em atividade desde 1962. Não há nada de novo as cadeiras são de madeira com assentos de palha, mesas marcadas pelos copos, estante cheia de bebidas antigas e teias de aranha enfeitando o teto e, no balcão, as pessoas se aglomeram para beber e assistir aos jogos, sem frescura.
O dono, Flávio, comanda a bodega desde 1999. Jeito de piazão, boné de hockey e camisa preta lhe atende com uma cordialidade taciturna e truculenta. Com olhos de lince mantém a ordem e enxota qualquer cidadão mal intencionado. Resumindo, ambiente nostálgico o qual títulos, camisas sociais ou de brim não interferem para o bom jogo amistoso. Ali a taça é o copo e o título é ostentar os cabelos grisalhos e a barriga saliente.
Enfim, no boteco a partida já havia começado de um lado o Coritiba e do outro o Fluminense. As duas equipes se enfrentam, em Curitiba, pela 5° rodada do “Brasileirão” 2013, vale a liderança do campeonato, nervos de aço e olhos atentos a cada lance.
Já nos primeiros minutos da partida a equipe da casa pressionava. Falta na entrada da pequena área.
– Dali fica longe para o Alex, não dá pra ele.
Assim dizia o ébrio Jaime, de jeans e jaqueta de camurça, rosto vermelho, resumia os lances importantes do jogo, falta, perigo de gol, na trave, intervalo. Alex bate! O goleiro se estica e joga para escanteio, inflamada a torcida grita “Cooooxaaaaa”.
Empurrados pela massa o Coritiba abre o placar aos 16min. Em jogada pela lateral esquerda, o camisa 10 da um toque em diagonal, entre os dois zagueiros do Flu, para Robinho que desvia para as redes, 1×0. A torcida no bar se anima, mas não é momento para discurso de vitória, “o futebol é uma caixinha de surpresas”.
– Ohh, Flávio! Me vê dois bolinhos e mais uma.
Acompanhado da pimenta e da mostarda marrom o bolinho desceu rasgando, o Flu iguala o marcador aos 25min. Na batida do escanteio Carlinhos se antecipa à marcação e iguala o marcador.
– Putzzzzzz! Você viu a jogada Nei?
– Tá dormindo a zaga.
Vociferava Jaime do balcão traduzindo o sentimento de indignação com gol sem brilho do adversário. Sem lances importantes assim a partida prosseguiu até o segundo tempo.
Na virada do jogo as equipes voltaram às mesmas do início da partida. Meu irmão falava pouco estava apreensivo, o Fluminense criava boas oportunidades com Rhyaner, todavia o Coritiba tinha em campo a estrela de Alex que por pouco, aos 23min., não desempatada a partida, na batida Ricardo Berna defende e impede que o alviverde avance no placar.
As duas equipes seguem criando boas jogadas, contudo sem chances reais de gol. Na quarta cerveja o sentimento de empate pairava no bar, pensando na volta pra casa cabisbaixos e reclamando das substituições de Junior Urso, jogando bem, por Everton Costa e a entrada de Botinelli.
Meu irmão exclamava:
– Só tem meio campo nesse time!
E Jaime “corneteava” o 10 do Coxa:
– Ta fora de forma.
Mas, o Coritiba jogava pela vitória e aos 43min., faltando dois para o final, em lance pela direita Willian Farias passa para Alex que, por sua vez, ajeita, levanta a cabeça olha para o goleiro e de canhota solta o canudo.
– Goooollllllllllllll!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!.
Num grito eufórico de gol o bar inteiro pulou, gritou, se abraçou e ficou rouco, era final de Copa do Mundo. Garçom! A conta.
– Coritiba 2, Fluminense 1.
– Um grande jogador tem amor à camisa!
Jaime encerra a conta e vai embora, feliz e cambaleante.