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Jurista destaca as “14 Estações da Via Crúcis de Lula”

Nesta quarta-feira (11), o “Acampamento Lula Livre”, que reúne militantes do PT e de diversos movimentos sociais nas proximidades da Polícia Federal em Curitiba, recebeu renomados juristas brasileiros que realizaram um ato em prol do ex-presidente e teceram críticas à condenação e à prisão do petista.

Participaram do ato o professor da Universidade de Brasília, Dr. Marcelo Neves, as professoras da Universidade Federal do Paraná, Drª. Katya Isaguirre e Drª. Eneida Desirée Salgado, além do Dr. Juarez Cirino dos Santos, professor aposentado da UFPR e ex-advogado de Lula.

O discurso mais marcante foi o proferido pelo Dr. Marcelo Neves. Professor titular da Universidade de Brasília, Neves lecionou em universidades de países da Europa como Alemanha, Itália e Suíça, além de ter sido conselheiro do Conselho Nacional de Justiça.

Durante sua fala, fez uma analogia à Via Crúcis de Jesus Cristo (que corresponde ao trajeto que foi percorrido por Jesus carregando a cruz desde o Pretório até o Calvário) no que chamou de “Via Crúcis de Lula”. No paralelo, o professor se remete às 14 estações que, para ele, começaram no impeachment de Dilma Roussef e podem terminar com a derrota da democracia por meio de uma Intervenção Militar. “Eu diria que estamos em um golpe continuado de natureza judicial, parlamentar e midiática, com base, evidentemente, no grande capital. Nesse movimento farei um paralelismo com as estações da Via Crúcis. Sabemos que no calvário de Cristo houveram 14 estações, portanto, trarei aqui as 14 estações da Via Crúcis de Lula e do povo brasileiro”, disse no início do discurso

1ª Estação- O impeachment de Dilma Rousseff

Segundo Neves, a invenção das pedaladas fiscais e de decretos suplementares que visam justificar o crime de responsabilidade fiscal não têm o menor fundamento. “Não fazem sentido porque isso era utilizado antes, em 2002, pelo presidente Fernando Henrique Cardoso. Na época o TCU dizia apenas que eram falhas orçamentárias sanáveis. Não há inconstitucionalidade e ilegalidade que pode justificar o impeachment”, enfatizou. O professor também afirmou que, além disso, houveram falhas formais que os ministros do Supremo Tribunal Federal não tiveram coragem de enfrentar. “A principal delas é que o artigo 23 da Lei de Impeachment não permite a condução do voto pelas lideranças, muito menos a fidelidade partidária, no caso, os deputados e senadores são atípicos e não podem julgar a fidelidade partidária. Portanto, o impeachment deveria ser anulado por ilegalidades formais”.

2ª Estação – A condução coercitiva de Lula

Sobre a condução coercitiva de Lula em março de 2016 Neves ressaltou que ela foi ilegal. “O artigo 260 do Código de Processo Penal define que só cabe a condução coercitiva quando a pessoa não aceita a intimação. Lula não foi intimado a nada, não apresentava nem um perigo para a ordem pública, não havia nenhum elemento para justificar qualquer ato como a condução coercitiva”, disse.

Para Neves há um golpe ainda em curso.

3 ª Estação – A interceptação criminosa

A terceira estação, segundo o jurista, se deu quando o juiz Sérgio Moro realizou e divulgou interceptações telefônicas do ex-presidente com políticos envolvidos na Lava jato. “O Moro praticou crime ao transgredir o que determina o artigo 10 da Lei 9696/96 que diz que quem interceptar sem autoridade judicial está praticando um crime. Ele não tinha autoridade judicial porque quem tinha essa autoridade era o Supremo Tribunal Federal. Assim, quando você instrumentaliza a investigação para fins criminosos você está praticando um crime”.

4 ª Estação – Decisão de Gilmar Mendes

Para Neves, a decisão de Gilmar Mendes (que impediu Lula de assumir um Ministério no Governo Dilma) é o retrato da politização do judiciário. “Essa decisão impediu que Lula fosse nomeado ministro, que era um ato do executivo, um ato livre. Mendes imputou uma liminar. Depois desse impedimento o ato foi anulado pelo Supremo, ou seja, foi criado apenas para impedir que Lula assumisse um ministério”, relembrou.

5 ª Estação – A decisão monocrática de Teori Zavascki

Ainda sobre as interceptações telefônicas Marcelo Neves criticou o então Ministro do STF Teori Zavascki que, segundo ele, apenas anulou o ato, não encaminhando para o Conselho Nacional de Justiça nem para o Ministério Público uma prática criminosa e, para ele, disciplinarmente absurda do juiz Sérgio Moro.

6 ª Estação – A morte de Teori Zavascki

Nas palavras de Neves, “fiquemos cientes de que é muito provável que a morte dele não foi algo acidental, haviam interesses envolvendo políticos como Aécio Neves”.

7 ª Estação – A nomeação de Alexandre Moraes

Para o professor o Ministro é um instrumento do golpe e foi nomeado para fazer o serviço certo no Supremo Tribunal.

 

Centenas de pessoas acompanharam o ato dos juristas.

8ª Estação – O desmonte dos elementos do estado social

Neste momento da fala Neves destacou que temos instituições do estado social muito pobres e precárias, mas que passavam por um constante desenvolvimento e que hoje sofrem com constantes retrocessos. “A Emenda 95, a Reforma Trabalhista e a tentativa da Reforma da Previdência é um exemplo da destruição do estado social no Brasil”.

9 ª Estação – O processo de Moro

O professor teceu duras críticas à Sérgio Moro e expôs falhas e contradições do processo que condenou Lula. “Ele atuou parcialmente contra o artigo 36 da Lei Orgânica da Magistratura Nacional que diz que você não pode se manifestar sobre o processo que vai julgar. A sentença condenatória não foi fruto de provas, houve apenas uma delação premiada que é somente um meio de se obter provas. Além do mais, mesmo que houvessem provas, não há tipificação penal, não cabe enquadramento pelo que foi antes e durante. Se eu for juiz me valendo desses elementos eu condeno quem eu quiser na hora em que eu quiser”.

10ª Estação – O assassinato da vereadora Marielle Loyola

Para Neves foi uma execução, um feminicídio e um crime contra as forças políticas populares. “Nesse momento o golpe mostra que é despudorado”.

11ª Estação – O julgamento do Habeas Corpus de Lula no STF

Incisivo, o professor da UNB analisou o julgamento do Habeas Corpus do ex-presidente Lula como um espetáculo midiático. “O Manuel Bandeira dizia que macaqueávamos a sintaxe lusíada para tentar falar o português de Portugal, quando deveríamos falar o português gostoso do Brasil. E o que esses caras fazem é macaquear a sintaxe germânica e estadunidense, o que os torna papagaios sem noção da especificidade do caso. Eles levaram o nível de discussão a patamares difíceis quando o caso era fácil com uma regra clara, uma regra de defesa das garantias. Aquela era pra ser uma sessão de duas a três horas mas, infelizmente, todos os ministros do Supremo resolveram assumir o papel de celebridade de novela. Com isso, a sessão tomou um realismo fantástico. O Fachin citou as decisões da Corte Interamericana de Direitos Humanos como se Lula tivesse praticado um crime de violação dos Direitos Humanos, isso é uma loucura! O voto da Rosa Webber caiu na ridicularia. Caiu porque ela disse, ‘eu não aplico porque sou solidária ao colegiado’, mas e se fosse uma pena de morte? Ela diria, ‘eu tenho convicção de que está errado mas não vou votar a favor do habeas corpus porque vou respeitar o colegiado’. No outro dia o réu estaria morto”, ironizou Neves.

12 ª Estação – A prisão de Lula

Para ele é a tentativa definitiva de exclui-lo do processo eleitoral.

13 ª Estação – O possível assassinato de Lula

Em tom grave o professor disse é preciso alerta, pois o perigo é real. “Por meio do Sergio Moro o Lula foi deixado em uma Polícia Federal corrupta, parcial que trata a elite com vozinha fina e quando é com o Lula a voz engrossa. Parafraseio o Chico Buarque quando ele diz ‘não gosto de governo que fala grosso com a Bolívia e fala fininho com Bush’. E tudo isso está a serviço do capitalismo, da financeiração da universidade, da financeiração da educação e da saúde pública”.

14 ª Estação – Adiamento das eleições ou intervenção militar

Para Marcelo Neves isso seria o fim da Via Crúcis. “Ainda estamos na 12 ª Estação e temos condições de reverter esse quadro por meio da mobilização popular e da desobediência civil, e ela ocorre quando o estado não consegue atuar garantindo o estado de direito”, finalizou.

Demais juristas

Eneida Desirée Salgado.

Os outros juristas comungaram com as considerações do professor da UNB. Eneida Desirée Salgado afirmou que quem está praticando desobediência civil não é o povo que está na resistência, mas os juízes que deixam de aplicar o direito civil, que ignoram a Constituição para fazer a defesa dos seus interesses, dos da elite e os dos golpistas. “Esses magistrados deixam de trazer elementos jurídicos para trazer a justiça seletiva em seu lugar. Há décadas os que mandavam no país perderam a chance de fazer uma Constituição só para a elite, porque a nossa Constituição é esquisita, tem uma série de contradições, mas é uma Constituição que permite que os movimentos sociais se manifestem e construam uma alternativa diferente de país. Nós juristas temos culpa de o Poder Judiciário ter se tornado o que se tornou. Tiramos o poder do Legislativo acreditando que o Judiciário ajudaria a implantar e concretizar as transformações sociais de que o Brasil precisava, mas ele se tornou o poder da elite, com um processo de admissão muito excludente provando que não fala com a população”.

Katya Isaguirre.

Katya Isaguirre ressaltou que o STF precisa entender que é uma instituição que faz parte da realidade social e seu papel é defender os direitos e as garantias fundamentais, que foram colocados na Constituição porque fazem parte de um projeto de sociedade. “O que assistimos no julgamento do Habeas Corpus do Lula foram debates infindáveis, muita teoria, mas não houve um debate sério das consequências sócio-políticas dessa decisão na nossa realidade”, disse.

Dr. Juarez Cirino dos Santos

 

 

 

Já o ex-advogado de Lula, Dr. Juarez, descreveu o cenário atual como uma acirrada luta de classes. “O maior presidente da história do Brasil está preso aqui hoje. Falo como advogado do MST, algo que tenho muito orgulho de fazer, e falo também como ex-advogado do presidente Lula. Continuo como defensor do Lula fora do processo. O que vivemos hoje é um momento muito agudo do fenômeno de luta de classes. Algo que se caracterizou, nos últimos anos, exatamente pela transferência do cenário da luta das ruas e das praças públicas, onde Lula venceu duas eleições, para a 13 ª Vara Federal Criminal de Curitiba. Essa transferência foi feita pela classe dominante”.

 

 

 

About José Pires

É Jornalista e editor do Parágrafo 2. Cobre temas ligados à luta indígena; meio ambiente; luta por moradia; realidade de imigrantes; educação; política e cultura. É assessor de imprensa do Sindicato dos Professores de Ensino Superior de Curitiba e Região Metropolitana - SINPES e como freelancer produz conteúdo para outros veículos de jornalismo independente.