Coluna Filosofia di Vina
Às vezes, o humor é uma forma de alento, um certo suspiro diante do absurdo, uma pausa para rirmos juntos. O humor sincero só se dá entre amigos, face a face. Esse, sim, é um humor com graça, porque se ri com o outro, sobre o outro e esse outro também sou eu. E embora até pudesse parecer um “meme” típico desses tempos, a postagem realizada, no último dia 09/07/2020, pela Secretaria de Estado da Educação e do Esporte do Paraná (SEED – PR) é na verdade exemplo de grosseiro mau humor sem graça, expressão cruel de um cinismo desleixado e sem compaixão. Um rir-se do outro sem outro.
É preciso, no entanto, situar melhor o contexto dessa postagem. Obviamente, esse é um tempo de exceção e a anormalidade agora é a expressão do cotidiano. As atividades escolares, a exemplo de tantas outras, seguem acontecendo de forma remota. Não há dúvida sobre a complexidade envolvida na tarefa de colocar em funcionamento todo um aparato tecnológico, ainda mais quando a urgência necessária para implementar algumas medidas se confronta com as peculiares características do sistema escolar. O problema é ligar o novo no velho sem perder a cara da escola. Além da necessária urgência, a introdução dessas alternativas tecnológicas está se chocando com o despreparo de toda a comunidade escolar: falta estrutura de acesso à internet, falta treinamento para professores e alunos, falta computador e celular. Por causa de tanta falta, até acho que a SEED-PR deve ser reprovada. Reprovação direta. Vai ver que ela nem está tão preocupada assim com a escola.
Outra coisa curiosa nesse momento é a notável isenção da SEED-PR na hora de assumir determinadas responsabilidades. Nem tanto por sua própria culpa, mas é que existe um novo patrão no pedaço: Google Classroom. Além do suporte operacional, ele exerce função gerencial e estatística. Gerir, medir e controlar. Há relatos de professores que realizam jornadas de até doze horas por dia para dar conta das metas estabelecidas. É o tipo de pressão que deixa bem claro que o importante agora é produzir números. Se, por um lado, a tecnologia vai borrando a nossa compreensão de trabalho, afinal quem manda é o “sistema”, por outro, há uma responsabilização e culpabilização do indivíduo. Explico melhor. As condições em que o trabalho remoto se realiza são totalmente apagadas do contexto. A fronteira entre o lar e o trabalho desaparece. O tempo dedicado ao trabalho é embaralhado ao tempo dedicado para outras atividades. Um sempre presente e inacabado. Toda hora é hora. A sala da casa é agora um sem-número de outras salas de outras casas e todas transformadas em sala de aula. Tudo disponível a todo momento, bastar acessar. E se você não tiver as condições suficientes, ou não conseguir desenvolver alguma atividade, isso já não é um problema da SEED-PR.
Isso não é problema meu! Lá no fundo, naquela postagem do último dia 09/07/2020, a SEED-PR quis dizer exatamente isso. Seria uma grande sacada, um deboche irreverente para quebrar a tensão dos últimos dias, mas isso não é um meme e no fim do dia não resta nem mesmo tempo para o humor. Só uma cara cansada pensando em tantas atividades por fazer, mensagens para responder e web conferências para preparar. Não resta tempo e nem mesmo há um outro para dividir essa piada. Só essa cara de palhaço.
O senhor Secretário de educação mostra que além de ser o “homem que vende de tudo”, é um mestre do não humor. A posição institucional da SEED é de rir enquanto muitos choram. Como rir enquanto professores adoecem? Como rir das constantes ameaças de perca de direitos? Será que estão rindo os professores PSS ainda sem aula e sem perspectiva? Devemos rir perante o fechamento de turmas? Devemos rir dos estudantes que não tem como acompanhar as aulas remotas? Neste grande circo que se transformou a SEED só há um palhaço e não é o professor. Ele tem sorriso de bom moço é sem graça e adora maquiar números.
Alexsander Machado é mestrando em educação pela UFPR.
Rafael Pires de Mello é colunista do Parágrafo 2.