Em 11 de março de 2020 a Organização Mundial da Saúde (OMS) caracterizou as infecções geradas pelo Novo Coronavírus como pandemia. Á partir de então, frente à falta de um medicamento eficaz no combate ao vírus e ainda sem uma vacina capaz de imunizar a população, a OMS tem recomendado o isolamento social como forma mais eficiente de prevenção à Covid-19. Hoje, os órgãos de saúde estão trabalhando com duas frentes de isolamento: isolamento vertical, para os grupos de risco e isolamento horizontal, que se estende para toda a população e é recomendada para todos aqueles que não trabalham com atividade essenciais e podem ficar em casa. Para a OMS, 70% é um índice ideal de isolamento social para se controlar a propagação da doença.
Países como a Itália e a Espanha, por exemplo, conseguiram diminuir os contágios e as mortes apenas quando instituíram o lockdown (isolamento social mais rígido que proíbe a circulação de pessoas). Já no Brasil, os índices de isolamento social são muito abaixo dos recomendados pela OMS. Segundo dados da empresa INLOCO, que monitora, via uso de celular, a quantidade de pessoas que têm ficado em casa durante a pandemia, o índice de isolamento social no país é 38,36% (27/05). O estado do Paraná tem a terceira pior taxa de isolamento: 37,8% (27/05).
E essa é também a realidade da Região Metropolitana de Curitiba. Com 29 cidades que abrigam cerca de 3.693.817 pessoas, o índice de isolamento social médio da Grande Curitiba é de 42%. O Parágrafo 2 analisou dados enviados pela INLOCO no período de 01/04 a 20/05 e o que se pode constatar é que os índices de isolamento social na RM diminuíram consideravelmente nas últimas semanas.
As quatro cidades com maior número de casos e mortes por Covid-19 na Região Metropolitana têm em média taxas de 42% e 43% de isolamento social. Nestes municípios, atividades como comércio e indústrias seguem a todo o vapor. São proibidos, no entanto, eventos que gerem aglomerações como festas, por exemplo. Porém, na prática, o que se percebe são episódios que ignoram as recomendações de distanciamento social.
Em um domingo de sol dezenas de jovens soltam pipa, ouvem música e bebem no bairro Jardim Amélia em Pinhais (vídeo abaixo). As aglomerações são muito comuns na cidade, como ressalta um morador que prefere não se identificar. “Aqui ninguém respeita o isolamento social. Os mercados estão superlotados, sem higienização, e em determinados locais é comum perceber muitos adultos e também muitas crianças participando de aglomerações, sem distanciamento e também sem máscaras”, diz. Já Vladimir Oliveira, também morador do Jardim Amélia, destaca que Pinhais não tem políticas claras de isolamento social. “Nossa cidade tem uma grande densidade populacional e, além disso, circulam por aqui diariamente muitas pessoas de cidades vizinhas como Curitiba, Piraquara e Colombo. Faltam políticas claras por parte do município para controlar aglomerações e incentivar o distanciamento social”, ressalta.
Vídeo gravado por um morador do Jardim Amélia em Pinhais, no dia 17/05.
Em Fazenda Rio Grande, município distante 30 quilômetros de Curitiba, o índice de isolamento social é de 42%. Lá, aglomerações também são comuns como destaca Bruno Fernando Guerino de Souza, morador do bairro Estados I. “Aqui em Fazenda Rio Grande a impressão que dá é que não está acontecendo uma epidemia no Brasil e no mundo. Tem muitas festas nos finais de semana, pessoas aglomeradas em praças soltando pipa e, além disso, a falta de água tem feito as pessoas se aglomerarem também quando chegam os caminhões da Sanepar para fazer os abastecimentos”, conta Bruno.
Aumento no número de casos
O Boletim Epidemiológico da Secretaria Estadual de Saúde (Sesa) do dia 27/05 revela que São José dos Pinhais, Fazenda Rio Grande, Pinhais e Campina Grande do Sul são os municípios com mais casos e óbitos por Covid-19 entre as 29 cidades da Região Metropolitana de Curitiba.
Conforme o boletim, e também dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), esses eram os índices de casos, número de mortes, incidência e letalidade destes municípios em 27/05:
São José dos Pinhais contava com 77 casos e quatro mortes, incidência de 22 casos por 100 mil habitantes e uma taxa de letalidade de 5,5 %.
Fazenda Rio Grande contava com 54 casos e quatro mortes, incidência de 49,9 casos por 100 mil pessoas e uma taxa de letalidade de 8,0%.
Pinhais contava com 62 casos e três mortes, incidência de 41,6 casos por 100 mil habitantes e uma taxa de letalidade de 5,5%.
Campina Grande do Sul contava com 29 casos e três mortes, incidência de 67,0 casos por 100 mil habitantes e taxa de letalidade de 10,3%.
Colombo (35 casos), Campo Largo (37 casos e duas mortes) e Araucária (53 casos) tem mais casos que Campina Grande do Sul, mas número menor de mortes.
Em 1º de abril – data de início da série analisada pelo Parágrafo 2 – conforme boletim da Sesa, São José dos Pinhais tinha 04 casos, Fazenda Rio Grande 01 caso, Pinhais 05 casos e Campina Grande do Sul nenhum. A Região Metropolitana tinha nessa data 23 casos e nenhuma morte. Hoje temos 503 casos e 19 mortes.
Relaxamento
O índice de isolamento social entre estas cidades é muito parecido. No período de 01/04 a 20/05, segundo levantamento da INLOCO, São José dos Pinhais registrou isolamento médio de 43%; Fazenda Rio Grande 42%; Pinhais 43% e Campina Grande do Sul 41%.
Estes municípios, porém, tiveram uma diminuição gradativa de isolamento social nos últimos 50 dias. O Parágrafo 2 analisou a média de isolamento social entre 01/04 e 01/05 e 01/05 a 20/05. A diminuição no número de pessoas que permaneceram em casa chegou a 7% em alguns casos. Confira abaixo as tabelas que mostram como o índice de isolamento social diminuiu nestas cidades:
Para o cientista político Manoel Neto, que há anos estuda o avanço de pandemias e seu relacionamento com políticas públicas, apenas os níveis de isolamento social não podem ser parâmetro para a disseminação do vírus. “É preciso levar em conta outros fatores que compõem os perfis das cidades como densidade demográfica, distância com a capital, economia, educação, entre outros. Ou seja, o isolamento social não é o único fator de sucesso no combate à pandemia”, esclarece.
Curiosamente o nível de isolamento social das cidades com menos casos de Covid-19 na Região Metropolitana de Curitiba (entre as que têm) é muito próximo das cidades que mais têm casos da doença. O município de Campo do Tenente tem apenas um caso e nenhuma morte e seu isolamento social médio – no período analisado pelo Parágrafo 2- é de 42%; Piên também tem apenas um caso e nenhuma morte e seu nível de isolamento é de 43%; Campo Magro registra dois casos e nenhuma morte e seu nível médio de isolamento social é de 42% e Contenda tem 03 casos, uma morte e isolamento social de 42%.
Porém, há um fator comum a todos os municípios que têm mais casos: Grande densidade demográfica. A densidade demográfica de São José dos Pinhais, cidade com 323,340 habitantes é de 279 habitantes por km². Fazenda Rio Grande, com 100,209 habitantes tem densidade de 700 habitantes por km². Campina Grande do Sul que tem uma população de 43,288 habitantes tem densidade demográfica de 71,90 habitantes por km² e Pinhais tem a maior densidade do grupo, com uma população de 132,157 pessoas tem densidade demográfica de 1,922,42 habitantes por km².
Na outra ponta da balança, as cidades com menos casos têm população e densidade demográfica menores. Campo do Tenente tem densidade demográfica 23,40 habitantes por km²; Campo Magro tem densidade de 90,22 habitantes por km²; Piên tem densidade de 44 pessoas por km² e Contenda 53,14 habitantes por km².
Os municípios com maior densidade populacional são mais industrializados e com comércio diversificado. Já os de menor densidade têm como características econômicas a agricultura e os pequenos comércios.
Assim, frente ao intenso fluxo de pessoas, o isolamento social é fator primordial na contenção do Coronavírus. Para Manoel Neto, o poder público tem responsabilidade direta na formulação de políticas estratégicas de combate à propagação da pandemia. “Temos claramente no país uma gestão confusa e sem comprometimento com a tarefa de controlar a pandemia. Existe no país um problema de Inteligência, e no Paraná não é diferente. É preciso de inteligência para compreender o problema e traçar estratégias para enfrenta-lo. Infelizmente o poder público, em todas as esferas, não tem estratégias claras de enfrentamento ao vírus”, completa.
O Parágrafo 2 entrou em contato com as assessorias de imprensa das quatro cidades com mais casos de Covid na Região Metropolitana. Questionamos quais as ações destas cidades no combate à pandemia e como as administrações veem a diminuição do isolamento social nestes municípios. Apenas Fazenda Rio Grande e Pinhais responderam. Abaixo seguem na íntegra as notas enviadas ao Parágrafo 2.
Fazenda Rio Grande:
“A Prefeitura de Fazenda Rio Grande investiu mais de R$ 5 milhões, desde o início da pandemia, em ações voltadas à prevenção e proteção da população em situação de vulnerabilidade.
Na área da Saúde contou com doações – principalmente da Universidade Federal do Paraná – de máscaras de proteção facial, caixas acrílicas para intubação, álcool em gel e câmara para descontaminação de máscaras.
O prefeito Marcio Wozniack criou e assinou o primeiro Decreto em 17 de março, que instituía suspensão das aulas, fechamentos de atividades de diversos setores, da Prefeitura (mantendo apenas os serviços essenciais).
Também houve a criação do Comitê de Enfrentamento à Crise do Coronavírus, que reuniu lideranças políticas, religiosas, secretários, profissionais da Saúde e forças de segurança.
A Prefeitura distribuiu mais de 100 máscaras para a população.
Também foi contratada uma empresa especializada em hidrojateamento sanitário, que lavou os principais pontos de aglomerações e todos os equipamentos de saúde e ruas dos bairros mais carentes.
A Guarda Municipal realizou ações conjuntas com a PM no Terminal Urbano, onde realizou operações de orientações aos usuários do transporte coletivo sobre uso de máscaras e álcool em gel.
A criação da campanha Fazenda rio Grande – Fazendo Pela Vida, tem o apoio logístico da Prefeitura de Fazenda Rio Grande – que armazena as doações. Elas são feitas em pelo menos 13 pontos de arrecadações e entregues a seis entidades que levam os materiais arrecadados para as famílias previamente cadastradas (elas já eram atendidas anteriormente pelas entidades).
Além disso, a Prefeitura construiu um hospital de campanha ao lado da UPA, para atendimento específico voltado ao COVID-19.
Também foram convocados médicos e profissionais da saúde.
O município instituiu o EAD na Educação, assim como, tem entregue kits de alimentos – equivalentes à merenda escolar que seria entregue no período -.
A Secretaria de Desenvolvimento Econômico desenvolveu em parceria com a Divisão de Vigilância em Saúde, um Manual de Enfrentamento ao COVID-19 que disponibilizou para as empresas do município.
A Prefeitura ressalta que os casos identificados no município foram, em sua maioria, de pessoas que contraíram a doença em outro município, mas por morarem em Fazenda Rio Grande, tiveram seus casos atrelados ao município.
Até a tarde de ontem (26) foram confirmados 59 casos, 33 recuperados e quatro mortes”.
Pinhais:
“Segundo o site In Loco, no período de 01/04 e 20/05 Pinhais teve uma taxa de isolamento social média de 43%. Entretanto, essa taxa caiu depois da reabertura do comércio no dia 13/04: Entre 01/04 e 12/04 era de 48% e entre 13/04 a 20/05 foi de 42%. Durante esse período os casos de Covid-19 no município cresceram de 13 casos em 13/04 para 47 casos em 20/05, com três mortes. A prefeitura acredita haver relação entre a diminuição no isolamento social e o aumento no número de casos em Pinhais?
Não existem pesquisas para afirmar a relação entre estas duas situações. Porém, pode-se afirmar que, no início da pandemia a população cumpria as orientações mais efetivamente, além de estarem mais isoladas. O relaxamento dos cuidados e o aumento das aglomerações levam a mais contaminações.
Que ações a prefeitura municipal toma para coibir aglomerações agora durante a pandemia?
Algumas ações foram colocadas em prática no sentido de evitar aglomerações, como: suspensão das aulas da rede municipal de ensino; fechamento de parques e praças; limitamos o funcionamento dos comércios. Alguns serviços foram suspensos ou modificadas as formas de atendimento para não causar aglomerações, respeitando o distanciamento, entre outras recomendações. Também foi decretado o uso obrigatório de máscaras e realizada a distribuição de forma gratuita para os que mais precisaram, bem como intensificamos as orientações para que os cidadãos fiquem em casa e só saiam se realmente for necessário.
Em qual cenário a prefeitura de Pinhais cogitaria realizar um lockdown vertical na cidade?
As equipes da Prefeitura acompanham as evoluções de contaminação, além de seguirem as recomendações da OMS e Ministério da Saúde. Tendo em vista este cenário, ainda não foi cogitado Lockdown.
Com que frequência o boletim com os números de contágio no município são publicados no site oficial da prefeitura?
Diariamente, a equipe de comunicação divulga, com base em dados da Secretaria Municipal de Saúde, o boletim oficial com casos confirmados, recuperados, suspeitos, óbitos e descartados. Além disso, semanalmente é apresentado um relatório no qual é possível acompanhar os dados sobre confirmados e óbitos por bairro, sexo e faixa etária, bem como verificar a evolução dos casos confirmados”.