Foto principal : Rodrigo Anjos
Quadro de entrevistas com autoras e autores.
“Instante de Livros” é uma iniciativa que pretende entrevistar nomes relevantes da literatura, assim como novos autores, ou mesmo aqueles que ainda não conseguiram a visibilidade merecida. A ideia é não se prender a rótulos. Haverão aqueles que tomarão a coluna como um espaço da “Literatura Marginal” ou da “Independente”. Mas o objetivo é mostrar boa literatura, poesia, contos, crônicas, romances. Trazer ao leitor uma conversa clara e objetiva, sem pender para as divagações muitas vezes comuns ao jornalismo cultural, nem se deixar perder pelo imediatismo limitante do jornalismo Hard News.
Quem está a frente desta empreitada é o filósofo e professor Rafael Pires de Mello.
Na estreia da coluna o entrevistado é o autor Eduardo Tornaghi. Carioca, ator e escritor, já foi considerado galã da teledramaturgia brasileira. Depois de filmes e novelas para televisão e cinema Tornaghi se tornou um militante da poesia e seu livro de estréia “Matéria de rascunho” se encontra hoje esgotado, mas você poderá baixa-lo em PDF por meio do link no final da entrevista.
É comum encontrar Tornaghi pelas ruas do Rio de Janeiro declamando poesia e participando de eventos literários. Um grande poeta que vale a pena conhecer, ou como ele mesmo diz “vale a pena garimpar”.
Parágrafo 2 – Caro Eduardo, conte-nos um pouco sobre quem é Eduardo Tornaghi.
Eduardo Tornaghi – Eduardo Tornaghi é um indivíduo tão indefinível como qualquer outro.
Parágrafo 2 – O sucesso e a fama midiática trazem muita grana e destaque. Na sua visão, quais são os problemas que este mundo traz consigo?
Eduardo Tornaghi – Grana só para alguns parceiros (e a um preço altíssimo), destaque sim, mas frequentemente da imagem falsa que interesse ao mercado, não ao artista. O problema maior é a despersonalização e o isolamento da vida real.
Parágrafo 2 – Falando sobre poesia, Leminski dizia que todos os povos amam os seus poetas, pois, o poeta é uma necessidade orgânica da sociedade, você concorda com isso? Qual é o papel da poesia para a humanidade?
Eduardo Tornaghi – Concordo em parte, Augusto dos Anjos e o próprio Leminski tão desprezados em vida que o digam. Mas sim, é uma necessidade orgânica da sociedade. O papel de toda arte é expandir a percepção para além do imediato. Um antídoto para os idiotas da objetividade.
Parágrafo 2 – Já que a poesia é uma necessidade orgânica, poderia nos indicar três poetas essenciais que você gostaria que todos os seres humanos um dia pudessem ler?
Eduardo Tornaghi – Não cabe ranking ou classificação quando o assunto é arte. O mesmo poema que não me diz nada um dia, no outro mostra-se uma revelação. Seres humanos são muito variados e variam o tempo todo como a vida. O bom na arte, como na natureza é a diversidade. Toda monocultura é estéril.
Parágrafo 2 – O Brasil parece cada vez mais se distanciar da arte e da cultura e começa a fazer isso de forma oficial, ou seja, por meio do incentivo público. Um exemplo disso são as reformas educacionais propostas pelo governo em 2016-2017 na qual áreas como filosofia, sociologia, história e literatura perdem espaço para uma formação voltada somente para o trabalho. Uma geração inteira formada sem estas áreas. Que tipo de futuro se podemos esperar?
Eduardo Tornaghi – Nosso modelo de ensino sempre foi mais uma doma do que educação. As experiências que tivemos de educação verdadeira sempre foram pequenas, localizadas e logo abafadas, então não creio que isso vá fazer grande diferença. Quem forma é a vida com seus desafios.
Parágrafo 2 – Em um belo texto Antonio Candido defende que a literatura seja um direito humano básico. Leminski dizia que sua utopia é a de que todos os homens se tornassem músicos para este planeta ser o mais barulhento do Sistema Solar. Em sua opinião há uma relação a arte e utopia?
Eduardo Tornaghi – Claro, se pensamos utopia como ideal. Mas utopia quer dizer “não lugar”. Prefiro pensar a arte como uma forma de lidar com o paradoxo do real. O mundo sempre nos surpreende, nunca vai pra onde acreditamos que irá. A arte nos ajuda nessa navegação à deriva que é a nossa vida.
Parágrafo 2 – Eduardo, você é um jovem de 66 anos. Pode-se dizer que sua geração contribuiu e ainda contribui muito para a construção de uma cultura e uma arte sólida e farta, de autores contemporâneos o que tem te chamado mais atenção? Seja em literatura ou cinema ou música. Será que a minha geração que tem a metade da idade da sua conseguirá levar adiante a missão de manter viva a arte? Não seríamos uma geração que envelheceu antes do tempo?
Eduardo Tornaghi- Que nada rapaz, essa garotada que tá aí está procurando tanto quanto qualquer geração anterior. Seria preciso que a força da vida estivesse esmaecendo para ser diferente. Agora, como tudo, o resultado só aparece depois, quando novos desafios já estarão tomando o lugar dos atuais.
Parágrafo 2 – Waly Salomão acreditava que a poesia futura seria feita a partir dos “olhos de lince” de uma câmera, a tecnologia contribuiria para a arte poética, você acredita que a tecnologia tem este poder?
Eduardo Tornaghi – Não. Os instrumentos mudam, mas é a mesma inquietação humana é que dita a criação.
Parágrafo 2- O Papopoético, é um canal onde as pessoas podem ter acesso à poesia de uma forma muito interessante, sua leitura e interpretação dos textos é realmente impagável. Como anda este projeto?
Eduardo Tornaghi- Meio parado. Ando sem instrumentos. Mas minha inquietação continua firme e forte. Se não escoa por lá, ecoa por cá. (obrigado pelo impagável, se bem que podia ajudar se alguém me pagasse alguma coisa)
Parágrafo 2 – Alguma dica para os leitores de uma boa maneira de se ler um poema?
Eduardo Tornaghi – Brincar. Ler de verdade exige de nós aquela ingenuidade infantil para quem tudo é novidade e nada é sagrado. A brincadeira é a forma natural da liberdade de criação. Mas brincar a sério como já fizemos quando éramos crianças. Em parte isso é amortecido em nós por uma “educação” que nos condiciona a procurar a resposta “certa” e tolhe assim nossa liberdade de criação. Ler de verdade é criar, não reproduzir. Isso a gente deixa para os computadores.
Parágrafo 2 – Qual a sua relação e história com o poeta Cairo Trindade?
Eduardo Tornaghi – Somos bons amigos. Conhecemo-nos há muitos anos em jornadas libertárias e devo a ele o impulso para escrever. Serei sempre seu devedor por isso.
Parágrafo 2 – Você optou em sair da cena televisiva e viajar pelo país para descobrir sua essência, como foi isso? O que descobriu?
Eduardo Tornaghi – Privilégios podem nos transformar em idiotas e fiquei com medo disso, por isso me afastei. Queria ter substância por isso viajei. Descobri o idiota que sou, bem mais consistente do que o idiota que pensa ser o que sua imagem pública diz
Parágrafo 2 – O que é o Brasil?
Eduardo Tornaghi – Uma construção ainda nas fundações. Se os modernistas estavam certos vai ficar lindo, mas ainda demora um pouco
Parágrafo 2 – O meu predileto de seus poemas é o “Currículo”. Já chorou? Já é completo?
Eduardo Tornaghi- Não existe completo. É uma ilusão muito humana como o lixo.
Parágrafo 2 – Como ter acesso aos seus textos, como comprar livros ou acompanhar seu trabalho para os leitores?
Eduardo Tornaghi – Isso é uma encrenca pra mim. Nem eu tenho acesso. A exceção foi, graças ao Cairo, o Matéria de Rascunho que está esgotado e assim vai ficar por falta de fundos. Mas mando junto o pdf do dito cujo que você pode dispor como quiser.
Link do livro “Matéria de rascunho” para baixar e PDF.
http://www.filedropper.com/mioloedicaoduplozerocorrigido1-4-14
Link do canal Papoético: