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Grupo de professores protocola denúncia de assédio religioso em escolas de Paranaguá-PR

Estamos no meio de um escândalo sem proporções no MEC (Ministério da Educação), onde pastores evangélicos estariam se beneficiando da intermediação entre as prefeituras e o Ministério de verbas do FNDE (Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação) (https://www.bbc.com/portuguese/brasil-60842429). Mas a tutelagem de grupos religiosos sobre a educação pode ter rebatimentos mais profundos que o mero superfaturamento de verbas para a construção de igrejas, como sugerido pelo pastor e ministro da educação Milton Ribeiro.
Neste dia 08 de Abril professores e entidades representativas – tais como o Coletivo Humanidades, Programa de Pós-graduação em Ciência, Tecnologia e Sociedade do IFPR/Paranaguá, Sindiedutec, Colegiado do curso de licenciatura em História da UNESPAR – Campus Paranaguá, Diretório Acadêmico de História da UNESPAR – Campus Paranaguá e colegiado do curso de Ciências Sociais do Instituto Federal do Paraná – apresentaram à Procuradoria de Educação pública e ao Procurador Geral de Justiça do Paraná uma denuncia sobre a promoção de atividades religiosas, chamadas de atividades motivacionais, dentro de escolas no município de Paranaguá, litoral do Paraná. Segundo a denúncia, as atividades seriam conduzidas pelo grupo Connection, que se propõe a realizar diálogos com jovens, e com uma subdivisão dedicada à atuação em escolas desde 2019. O grupo seguiu lotando salas de aula para a realização de atividades religiosas mesmo durante o período de isolamento social necessário devida à pandemia de COVID-19.
Segundo o documento, “Com uma inicial motivação pedagógica de desenvolvimento das questões como drogadição ou prevenção ao suicídio, as palestras se direcionam, sem critérios técnicos definidos, para a promoção e imposição de uma crença religiosa, provocando constrangimento e coerção em função do preceito cristão. Com máximas emblemáticas ligadas às religiões cristãs (como estarem apenas levando o “amor de Deus” ou “Jesus nas escolas”) se auto avaliam como universais e acima de qualquer religião.” (p. 2 da denúncia). Tais ações ferem o inciso VI do artigo 5° da Constituição federal, onde assegura-se a inviolabilidade da liberdade e da consciência de crença, além de ferir a separação entre religião e Estado, já que instituições públicas estariam sendo utilizadas para promover práticas religiosas, assim como intolerância religiosa em relação a outras crenças, em especial, as de matriz africana.
O relato de um professor, anexado à denúncia em condição de anonimato, deixa bastante claro o teor destas atividades.

“No dia 10/03/22 aconteceu no Colégio Alberto Gomes Veiga uma atividade que fez parte do “Seminário da Paz” promovido pela escola durante a semana.
[…] Durante as falas realizadas pelos integrantes do grupo, muitas falas problemáticas e de cunho moral ocorreram. Como por exemplo em dado momento o interlocutor cita que casou virgem aos 27 anos e que as meninas deveriam se preservar, em seguida fez a referência ao bagaço de uma laranja dizendo que quanto mais chupamos mais arregaçado o bagaço fica, acrescentou “imagina se você engravida? como vai estudar com filho”. Em meio este discurso moralista compartilhou a história de uma colega de escola que “pegava” todo mundo e que 4 anos depois morreu de AIDS. Sem trazer nenhuma informação relevante sobre a doença, prevenção etc, apenas citando de forma simplista o suposto ocorrido que seria resultado do comportamento vulgar da colega, ficou claro o direcionamento machista.
[…] Ao final alunos que gostariam de “mudar de vida” e “encontrar Jesus” foram chamados a frente para serem acolhidos pelos membros do grupo.”
O avanço do proselitismo religioso sobre as escolas não pode ser visto, como dito anteriormente, apenas como uma disputa por verbas e recursos destinados à educação. Trata-se de um projeto político muito bem estruturado, que tem como pauta a imposição de uma certa moralidade e religiosidade que buscam moldar crianças e jovens a uma lógica conservadora e autoritária, produzindo uma subjetividade que aceite estas ideias como únicas verdades possíveis. Nesta concepção, não se vê a escola como um espaço de pluralidade, convívio entre os diferentes, de combate à violência e de construção da democracia, mas como propagadora de noções e interpretações morais e religiosas bem específicas. Seguem abaixo as postagens no Facebook do grupo Conection sobre algumas de suas atuações em escolas.

About Kauê Avanzi

Kauê Avanzi é doutorando em Geografia pela FFLCH-USP, educador no Ensino Básico, poeta e músico. Gosta de escrever, se divertir e confraternizar.