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É hora de falar de uma primavera Latina? 

Coluna Filosofia Di vina 

“Temos guardado um silêncio parecido com a estupidez”

(Bolívar, S.)

Fotos: Agência – AFP

            A ilusão do neoliberalismo começa a ruir. Na América Latina, o barulho das ruas ecoa pelos Andes. No Equador, a insurreição das massas foi despertada pelo aumento dos combustíveis que subiu impagáveis 123%. A população tomou as ruas, parte dos militares apoiou os manifestantes, violência e prisão por parte do governo incendiaram ainda mais a massa. A onda de protestos chegou a ponto de oito policiais serem presos pelos manifestantes num ato histórico de resistência. Lenín Moreno recua para acalmar as manifestações que cresciam dia após dia. Por trás do ato covarde do governo equatoriano está uma exigência do FMI.

            O Chile está ainda em chamas e, junto com as ruas, queimam o modelo neoliberal empurrado garganta abaixo à população desde a ditadura nefasta de Pinochet. Sebastián Piñera autoriza o aumento do preço dos transportes coletivos de 800 para 830 pesos (3.75%), quase cinco reais brasileiros. Pode não parecer, mas o impacto desse aumento na renda das famílias mais pobres pode passar de 30% da renda líquida gastos somente com transporte.

            No Chile, a devastação causada pelo neoliberalismo dos Chicago boys nas últimas décadas é grande. As aposentadorias privatizadas não ultrapassam 60% do salário, levando milhares de famílias a se endividarem. Esse mesmo modelo assassino de pobres é o grande sonho de Paulo Guedes para os aposentados brasileiros.

            O resultado de 30 anos de exploração e empobrecimento sistemático da população chilena explode no aumento da passagem dos transportes coletivos neste outubro, deixando quase duas dezenas de mortos, 500 prisões e centenas de terminais destruídos. Ao ver o levante popular, Piñera recua e propõe medidas sociais para reparar a crise, a população ainda não está satisfeita. O modelo de aposentadorias no Chile é um sistema de assalto massivo à população.

            Na Argentina, Macri sofre uma reviravolta nas eleições de 2019, tanto o presidente argentino quanto o chileno trocavam elogios com Bolsonaro poucos meses atrás. Enquanto o turbilhão latino começa a bradar, Morales é ameaçado na Bolívia. O imperialismo internacional tenta tumultuar novamente as eleições locais, há clara tentativa de se fazer na Bolívia o que foi feito na Venezuela, será que a Argentina seguirá o mesmo caminho?        Há também as crises do Peru, Colômbia e Paraguai.

            Enquanto isso, no Brasil, discute-se a lavagem de roupa suja em público. O laranjal do partido de Bolsonaro começa a feder e uma versão trágica dos três patetas, encenada pelos filhos do presidente, é o prato do dia dos grandes jornais. A podridão evidente do governo ganha espaço e as grandes questões ficam em segundo plano, enquanto a direita troca ofensas infantis na presença do público, dá as mãos para cravar punhaladas de retrocessos nas costas do trabalhador.

            Quando os ventos latinos soprarão no Brasil? Quando o povo retomará as ruas? Após as lições de 2013, é preciso maior clareza e organização, mas de uma forma ou de outra é preciso começar. Qual será a fagulha que incendiará nossa estranha calmaria? Motivos se têm aos montes: a justiça aparelhada, a reforma trabalhista, o aumento da miséria, o desemprego, o achatamento dos salários, os incêndios na Amazônia, a lama da Vale, o óleo das praias nordestinas, o assassinato da comunidade negra e pobre das periferias.

            Bolsonaro dá um recado: alerta as forças armadas para estarem preparadas para o conflito, que até para ele é inevitável. A covardia do presidente diz muito sobre o que está por vir, despreparado, violento, autoritário e, ao mesmo tempo, submisso ao capital é o tom de seu discurso golpista.

            O povo brasileiro é maior que Bolsonaro, assim como os povos irmãos da América Latina estão mostrando que são maiores que seus governos e maiores também que a falácia do neoliberalismo. A luta no Chile continua e poderá inspirar a de todos sul-americanos e que seja forte como uma canção de Victor Jara e bela como um poema de Neruda.

About Rafael Pires de Mello

Rafael Pires de Mello é formado em filosofia pela UFPR, gosta de inutensílios como cinema,literatura,música e é claro o maior de todos, filosofia. Tem a tendência de chorar com música romântica quando bebe demais.