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Diário de Dominique 7. O táxi

Tempo tímido. Cidade discreta. Um homem, magro e espontâneo, de repente me pergunta se eu quero um táxi. Por que não? Ainda hesitava entre esta decisão e minha real presença nesta nova cidade. Ele me ajuda a colocar minha bagagem no porta-malas. Precisa agir rapidamente. Na verdade, o táxi era ele. Ele fez tudo com um largo sorriso. O sorriso de quem está à porta de uma cidade é um mito.

Chegava naquela parte de Santos onde a vida parecia transbordar ao longo da costa. “Os estudantes são os reis da praia e as meninas são excelentes. Tenho certeza de que você vai adorar morar aqui” disse-me o taxista com um sorriso no canto da boca. Longo olhar distraído pela janela. Vento suave que me acaricia o rosto. Acho que este país tem uma paisagem magnífica, apesar de ser conhecido como uma selva repleta das mulheres mais bonitas do mundo. A acreditar que, hoje, as mulheres se tornaram verdadeiros patrimônios culturais. O motorista me espia com um olhar discreto pelo retrovisor antes de me dizer: “Essa ilha que você vê ali, atrás do mar, se chama … (não me lembro o nome.), é um pouco o nosso orgulho. Um verdadeiro pedaço do paraíso. Você deveria visitá-la enquanto mora aqui. Conheço alguém que pode te levar lá”. Eu disse que era uma ótima ideia. Queria que ele me deixasse um pouco.

Sempre durmo durante as viagens. Principalmente se estiver viajando à noite. Desta vez, observei os outros dormirem durante todo o trajeto. Um cara que dormia ao meu lado roncava com todo o seu pulmão. Em um certo momento, ele acordou assustado. Como se algo ou alguém o obrigasse a fugir do seu sonho. Eu me pergunto quem poderia ser esse demônio que o seguiu dentro do seu sono. No minuto seguinte, ele já roncava belamente. Eu imagino a sequência. Você provavelmente está dizendo a si mesmo que esse pobre rapaz arruinou minha viagem. Na verdade, eu queria ficar consciente a noite toda. Eu precisava saltar de uma vida a outra mantendo meus olhos bem abertos. A gente pega um ônibus uma vez na vida sabendo que, no final da viagem, o futuro espera. É melhor, quando isso acontecer, que cada etapa se desenrole diante de nossos olhos. Ao longo de toda a minha infância, nunca consegui fechar os olhos na noite que precede o início das aulas. Sempre havia um novo par de sapatos, novas meias e um novo uniforme que eu mal podia esperar para mostrar aos meus camaradas. Crescendo, percebi que precisava mais do que isso para seduzir as garotas. Passamos nossas vidas desejando coisas que o tempo acabará por roer. Por puro ego, o ser humano faz parte do lote.

Agora mesmo, um homem com um sorriso elétrico está escrevendo um livro calmamente sentado em sua grande casa em Petit-Goâve. Sua esposa prepara o almoço e não hesitará em gritar para ele descer para comer. Ele levará pelo menos meia hora para se juntar a ela. Ele vai contar uma piadinha e beijá-la na testa antes de se sentar à mesa. À cada vez via minha mãe sucumbir ao seu charme incontestável, sorrindo com todo o seu rosto. Um amor que sobreviveu à fúria do tempo, pelo jovem que sou, esconde necessariamente o seu jogo. Mesmo maduro, barbudo e um pouco cansado, meu pai continua um dândi. Entre a imigração e os parentes, a distância é tão tênue que só preciso cruzar o pequeno rio das minhas memórias para reencontrar meus pais.

Estamos chegando, disse-me o motorista. Ele me tira da sonolência. Eu tinha acabado de cruzar o túnel do tempo bem diante de seus olhos. A recepcionista do sorriso forçado me mostra meu quarto no hotel. Lá deixei minhas coisas sabendo que vou dormir fora.

Carlile Max Dominique Cérilia

(Tradução: Renata Neves Granito)

About Carlile Cerilia

Carlile Max Dominique CERILIA, nascido em Petit-Goâven no Haiti, é um jovem poeta e escritor. Caminha quando não está lendo ou escrevendo. Gosta de se misturar com as paisagens: árvores, pessoas e animais. Ama cinema e música clássica. Lê Jean-Jacques Rousseau, Albert Camus, Victor Hugo, Voltaire, Dany Laferrière, Shakespeare. Hoje estuda Literatura no CREL (Centro de Pesquisa e Estudos Literários); Departamento, ANA (Narrator Apprentice Workshop). É imigrante e mora no Brasil há alguns meses.