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“Cerca de 1.000 profissionais de universidades foram demitidos em Curitiba durante a pandemia”

Entrevista 

Ao final do primeiro semestre letivo de 2020 Curitiba acompanhou estarrecida a quantidade de demissões de professores e outros profissionais em algumas das principais universidades da capital. A Universidade Positivo, comprada pela Cruzeiro do Sul Educacional no final de 2019 foi a responsável pela maior quantidade de demissões.

As universidades atribuem os desligamentos à crise econômica agravada pela pandemia. O Sindicato dos Professores de Ensino Superior de Curitiba e Região Metropolitana (Sinpes) porém, destaca que as demissões têm mais relação com o desejo de lucro a curto prazo do que com as dificuldades impostas pela necessidade de quarentena.

Em entrevista ao Parágrafo 2 o presidente do Sinpes, Valdyr Perrini, fala sobre a quantidade de demissões, sobre desrespeito aos direitos trabalhistas de professoras e professores e sobre a luta do sindicato frente a grupos milionários da educação privada.

Confira.

 

Parágrafo 2: Demissões de professores e professoras não são novidades ao final de cada semestre nas universidades privadas de Curitiba e Região Metropolitana. Entretanto, o final do primeiro semestre de 2020 ficou marcado pelo desligamento de centenas de docentes, ou seja, números muito maiores do que o habitual “turnover”. Quantos professores foram demitidos das principais instituições privadas em 2020 segundo estimativas do Sinpes?

 

Valdyr Perrini: É muito difícil fazer estimativas, pois não temos mais o termômetro representado pela homologação das rescisões, como ocorria antes da contrarreforma trabalhista. Para uma categoria integrada antes da pandemia por cerca de 6.000 profissionais, estima-se um número de demissões em torno de 1000 profissionais a partir de denúncias recebidas pelo Sindicato.

 

Parágrafo 2: À frente da maior quantidade de demitidos está a Universidade Positivo, instituição comprada em dezembro passado pelo grupo paulista Cruzeiro do Sul Educacional. O grupo, mesmo não divulgando dados oficiais admitiu ter mandado embora, a exemplo do que fez em São Paulo e também em Joinville, centenas de professores e professoras. Enquanto demitem docentes os paulistas fecham cursos presenciais e aumentam a quantidade em EAD. O Sinpes acredita que o aumento nos cursos e disciplinas em EAD tem ligação direta com as demissões? Ou a crise econômica gerada pela pandemia é a grande responsável pelas baixas como alegam a Positivo e também outras universidades?

 

Valdy Perrini: A pandemia é apenas um pretexto. A visão míope destes grandes grupos econômicos, que priorizam o lucro a curto prazo em detrimento da excelência do processo educacional, é o grande responsável pelas demissões que ocorreriam independente do advento da pandemia. Salvo exceções pontuais que confirmam a regra, as instituições de ensino superior prosseguiram funcionando normalmente pela via tele presencial, não se justificando esse número excessivo de demissões. A implantação açodada e sem critérios do ensino à distância no sentido da precarização do ensino é que é responsável por essas demissões.

 

Parágrafo 2: Outra grande universidade privada de Curitiba que foi comprada por um grupo paulista é o Unicuritiba. Ao contrário da Cruzeiro do Sul, o Grupo Ânima, que comprou a tradicional universidade de direito da capital paranaense não promoveu centenas de demissões de professores e professoras. No entanto, a política de expansão do Ensino a Distância também é o carro chefe da nova administração. Nos últimos meses o Ânima tenta promover mudanças radicais na estrutura curricular de todos os cursos da instituição, dentre as quais destaca-se a implantação de uma nova grade curricular baseada em Unidades Curriculares. No início de julho os coletivos que representam os alunos do Unicuritiba conseguiram parar, ao menos momentaneamente, essas mudanças por meio de uma ação judicial. Quais os maiores prejuízos das mudanças propostas pelo Ânima tanto para os docentes quanto para os alunos?

Valdyr Perrini: A implantação no âmbito do Unicuritiba das famigeradas unidades curriculares “enxuga” as horas de atividades docentes em sentido estrito, o que significa redução da carga horária e da remuneração dos professores e depreciação da qualidade de ensino a curto prazo e o desligamento de professores a médio e a longo prazo. Apesar da decisão judicial ser muito clara e o grupo Ânima ter anunciado a fusão da Unicuritiba com a Unisociesc com a adoção do nome da primeira instituição de ensino, as unidades curriculares estão sendo implantadas ao ver do Sinpes ao arrepio do que foi estabelecido judicialmente, “via Sociesc”. A questão ainda carece de apreciação judicial. Tanto os Diretórios Estudantis autores da ação quanto o Sinpes como amicus curiae estão tentando demonstrar a conduta fraudulenta do grupo Ânima e a imposição de multa por descumprimento da liminar deferida.  

Parágrafo 2: Além de demissões, o Sinpes tem denunciado também desrespeitos aos direitos dos professores como o não pagamento de adicional noturno e a redução ilegal da carga horária e do salário dos docentes. A que podemos atribuir essas condutas ilegais praticadas pelas universidades?

Valdyr Perrini: À tentativa de manter os polpudos lucros custe o que custar. Ao invés das instituições de ensino contentarem-se com lucros menores e se preocuparem em manter a qualidade de ensino, retendo sua clientela a médio e a longo prazo, estão infernizando a vida de seus professores com o acréscimo de trabalho e a redução de carga horária e de remuneração desenfreada. Ao ver do Sinpes isso representa um verdadeiro tiro no pé. Sobreviverão aquelas que souberem manter o capital humano e a excelência do ensino. Aquelas que priorizarem exclusivamente o lucro em detrimento da qualidade de ensino estão fadadas ao insucesso.

Parágrafo 2: Que tipo de ações um sindicato consegue fazer nesse momento de pandemia quando o isolamento social é necessário, o que impede ações mais energéticas como manifestações em frente às universidades, por exemplo? O que o Sinpes conseguiu fazer especificamente no caso da Universidade Positivo e do Unicuritiba?

Valdyr Perrini: Paradoxalmente temos conseguido nas assembleias virtuais um número de professores bem mais expressivo do que aquele que conseguíamos nas assembleias presenciais, antes da pandemia. A resposta rápida acerca das diversas irregularidades constatadas com a denúncia nas redes sociais e ofícios cobrando providências das IES tem surtido efeitos. Também temos conseguido traçar estratégias de pressão em conjunto com os alunos onde eles se encontram melhor organizados e isso tem gerado desgaste de algumas Instituição de Ensino Superior que, preocupadas com a imagem perante a comunidade acadêmica, por diversas vezes retrocedem. Assim, apesar das dificuldades o Sinpes tem conseguido cumprir sua função de fiscalizar e de denunciar.

Além disso, encontram-se em pauta o ajuizamento de ações como substituto processual para exigir que as empregadoras arquem com os custos até agora repassados aos professores em face do trabalho em casa, a exemplo da ação inicialmente vitoriosa ajuizada pelo Sindipetro contra a Petrobrás.

Isso tudo sem descuidar dos problemas antigos que precisam ser resolvidos mediante providências judiciais que se encontram em estudos, tais como a supressão da remuneração do Trabalho Discente Efetivo e o draconiano Plano de Cargos e Salários imposto mediante coação pela PUCPR.

Além das dezenas de ações que tramitam na Justiça do Trabalho em benefício dos professores da PUCPR, da Tuiuti, da Uniandrade, da FACEL, da SPEI, da Camões, dentre outras instituições de ensino superior e tem sido acompanhadas primorosamente pelo Sinpes.

Parágrafo 2: E a questão financeira? A Reforma Trabalhista de 2017 acabou com a contribuição sindical obrigatória que era a principal fonte de renda dos sindicatos. Como está a situação financeira do Sinpes hoje?

Valdyr Perrini: Precária pois minguaram as fontes de recursos. Entretanto, a categoria tem se conscientizado da importância e da necessidade do sindicato e tem colaborado na medida do possível com as finanças da entidade. Parte dos honorários advocatícios em diversas ações em que o Sinpes figura como substituto processual foi deslocado para os cofres da entidade. Embora travemos verdadeira economia de guerra, não tem faltado recursos para o essencial.

Parágrafo 2: Um levantamento sobre acordos sindicais divulgado pelo Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos (DIEESE) revela que a atuação dos sindicatos tem sido de extrema relevância para a garantia de direitos trabalhistas agora durante a pandemia. Segundo o levantamento, apenas nos primeiros meses de pandemia pelo menos 4,41 milhões de trabalhadores em todo o país foram abrangidos pelo conjunto das negociações intermediadas pelos sindicatos. Você acredita que a categoria dos professores do ensino superior privado também passará a abrir os olhos para a importância do sindicato agora que as instituições de ensino solapam direitos e promovem demissões de forma mais agressiva e recorrente?

Valdyr Perrini: Com certeza já se percebe esse fato. Alguns dos professores demitidos pela Cruzeiro do Sul na Universidade Positivo, por exemplo, estão entre aqueles que exerceram seu direito de recusar o pagamento da contribuição negocial, repassada por ocasião da última convenção apenas por alguns poucos empregadores. É visível o constrangimento destes docentes, notoriamente arrependidos em face da falta de politização e alienação demonstradas.

 

About José Pires

É Jornalista e editor do Parágrafo 2. Cobre temas ligados à luta indígena; meio ambiente; luta por moradia; realidade de imigrantes; educação; política e cultura. É assessor de imprensa do Sindicato dos Professores de Ensino Superior de Curitiba e Região Metropolitana - SINPES e como freelancer produz conteúdo para outros veículos de jornalismo independente.