Coluna Autofagia
Dia do Professor
Há 193 anos, Dom Pedro I baixava o decreto imperial no qual se instituía o ensino elementar no Brasil, determinado que todas as cidades, vilas e espaços institucionalizados como tal tivessem suas escolas, seus professores e suas comunidades escolares com intuito de alfabetizar, ou abecedarizar, crianças e jovens. Nestas escolas, devia-se ensinar a leitura, escrita e as quatro operações matemáticas. Este movimento educacional deu-se a partir da necessidade de qualificação profissional, melhor compreensão das estruturas sociais e do baixo nível de conhecimento dos Brasileiros.
Anos mais tarde, em 1947, um grupo de professores do Estado de São Paulo teve a ideia de criar o dia do Professor. A data, 15 de outubro, foi a escolhida pela ligação histórica com a institucionalização do ensino formal no Brasil. Além de homenagear os Mestres, tratava-se de crítica social e tinha como lema “O Professor é profissional. Educar é missão”, com o objetivo de valorizar o professor como individuo capacitado técnica e cientificamente para execução daquele trabalho. Em 1963, um ano antes do golpe militar, a data foi oficializada por meio do Decreto Federal 5.682, assinado pelo então presidente João Goulart.
A partir de 1964, como já mencionamos, o golpe militar colocou em xeque a educação brasileira. Com o regime totalitário, professores de todos os níveis de ensino, do primário à pós-graduação, passaram de mestres respeitados a inimigos da pátria. Durante 21 anos, educadores conviveram com cerceamento, perseguição, tortura e, muitas vezes, com a morte de colegas de profissão. Tudo isso se dava pela autonomia dos professores, mesmo com a tentativa de intimidação, em lutar pela liberdade e disseminá-la entre seus alunos e sociedade, despertando-lhes a ânsia pela justiça e o restabelecimento da democracia.
Nos anos seguintes, com o fim da ditadura militar, a constituição de 1988 e a liberdade de pensamento explicita no artigo 5°, acreditava-se em tempos de calmaria e desenvolvimento da educação. No entanto, em 1989, a educação mais uma vez teve suas estruturas abaladas, agora no Estado do Paraná. O Governador há época, Álvaro dias, em 30 de agosto, ordenou que a Cavalaria da Polícia Militar avançasse sobre os professores, pisoteando-os e agredindo-os. Centenas foram feridos e alguns deles carregam sequelas até hoje.
Recentemente, em 2015, como um Déjà vu, novamente lutando por salários dignos, melhores condições de trabalho, melhor adequação dos espaços escolares, e a proteção de suas aposentadorias, professores cobravam o governo para que se atentasse às essas questões. Porém, a resposta do então governador Beto Richa foi covarde e truculenta. Tal como Álvaro Dias, Richa ordenou que a polícia militar usasse a força e as armas que dispunham para intimidar os educadores. Na praça Nossa Senhora de Salete, no Centro Cívico (ironia o nome do Bairro), em Curitiba, viu-se um cenário de guerra: Tiros, bombas, sangue, pessoas caídas ao chão, choro e revolta. As imagens ali coletadas rodaram o mundo, gerando revolta em todos que as assistiram.
Mesmo com imagens fortes, horripilantes e indigestas, uma cena virou símbolo da luta de professores por uma educação pública de qualidade, justa e gratuita: A corrida desesperada e covarde de Fernando Francischini, hoje candidato a prefeito de Curitiba, em direção ao camburão da Polícia Militar, fugindo de um professor que o enfrentou e agigantou-se sobre ele, colocando-o no seu devido lugar – de quatro apoios no chão. A coragem daquele professor garantiu que o mundo visse a figura desprezível que se tornara aquele sujeito que hoje pede o voto dos curitibanos.
Por falar em curitibanos, não esqueçamos do atual prefeito da capital dos paranaenses. Ao ser eleito, garantiu que cumpriria todas as promessas de campanha, inclusive de melhorar as condições de ensino do magistério municipal. Mentira! Tão logo tomou posse como prefeito, uma das primeiras medidas adotadas por Rafael Greca (DEM) foi atacar a aposentadoria dos funcionários públicos da cidade. Em resposta, os professores impediram a votação do projeto na Câmara. Os vereadores, aliados de Greca, a toque de caixa, transferiram a votação para a Ópera de Arame. Os educadores lá estiveram com o intento de impedir o saque de suas aposentadorias pelo prefeito. Todavia, tal como fez Álvaro Dias e Beto Richa, Greca recebeu-lhes à bala de borracha, cacetes e spray de pimenta.
Mediante tantas atrocidades, talvez não seja necessário lembra-lo, meu caro leitor, que ser professor num país que luta contra a educação é mais do que um desafio, é um ato de heroísmo ou, talvez, de desobediência social. Escolher a educação como profissão, infelizmente, não é apenas escolher a desvalorização, mas, sim, colocar em risco sua própria integridade física – sua vida. O dia do Professor não pode ser visto apenas como uma data poética, utópica, quimérica, mas como uma data de fortalecimento da luta dos mestres por dignidade, autonomia e respeito. É um momento de reflexão, solidariedade e confiança em nossos professores. Você tem um professor especial? – Solidarize-se com ele, tome parte das lutas dele, siga com ele pelos espinhosos caminhos de resistência por independência.
*Imagem principal: Massacre de 1988.