Coluna Filosofia Di vina
De onde vieram as mulheres? De onde vieram estes cabelos, estes cheiros, estes olhos e estas vozes? A história, que geralmente é contada por homens brancos, costuma coloca-las em notas de rodapé. Esta dama inconstante chamada história, como mulher que é, está repleta de mistérios.
Há quem diga que vieram da costela de Adão, outros que era uma estrela que ligava o mundo dos homens com a cidade dos espíritos, a mulher, chave mestra do tempo e da eternidade. Na América Latina, se respeita a Pachamama, a origem matriarcal do mundo exige sempre que se ofereça à terra (mãe) o primeiro gole do copo e a placenta dos recém nascidos.
De uma forma ou de outra, os homens sempre buscam nelas suas grandes inspirações e frustrações. Figura central na poesia, causava as mais delirantes febres nos jovens poetas. O cristianismo a culpa pela curiosidade de comer o fruto proibido. O islã, fundamentalista, mutila seu sexo, por medo do prazer. O judaísmo, ortodoxo, manda seus meninos agradecerem a Javé por não terem nascido mulher.
A cultura imposta pelos homens no decorrer dos milênios nega a complexidade da natureza feminina. No Ocidente, o papel imposto às mulheres foi o de mãe, cozinheira e costureira. Obviamente que tal natureza não ficaria quieta como sonhavam e sonham alguns dos arrogantes defensores do gênero superior.
Dentre os milhares de exemplos em que a historiografia insiste em negar, há alguns que desafiam o posto de detentores da coragem dos homens. Rosa de Luxemburgo, doutora, ativista política pela causa dos trabalhadores, escritora e presa política por algumas vezes, teve seu fim decretado em um zoológico, assassinada em 1919 pela polícia alemã. Rosa criticava o militarismo e encabeçou a “insurreição de janeiro”, na Alemanha da primeira guerra. Seu cadáver foi encontrado em um canal. Mesmo com seu corpo destruído pelos tiros, a Rosa Vermelha lança no mundo seu perfume, que vai ser sentido por todas as gerações futuras.
No Brasil, Luz del Fuego resolve tirar a roupa e nunca mais recoloca. Mostra para o país do calor que os índios estavam certos, o corpo não é uma culpa, tampouco uma vergonha, errado estavam os brancos europeus que nos vestiram. Resolve ir morar em uma ilha, onde vivia com a natureza, ambas espiando a beleza pura uma da outra. Tentaram apagar a Luz del Fuego, não era aceitável que, além de viver nua, recebesse seus amantes, homens pobres e sem sobrenome importante. Três golpes de cassetete na cabeça ceifaram sua vida, mas nunca conseguiram apagar a Luz que um dia ela tinha acendido, uma luz acessa na escuridão dos idos de 1967, em plena ditadura militar.
Os exemplos daquelas que desafiaram o papel que lhes foi incumbido sem se importar com as consequências são muitos. Sem temer as fogueiras, seja das fábricas – como em 1857 – ou do santo fogo da inquisição, o grito silencioso das mulheres se faz ecoar pelos séculos e causa espanto pela beleza, está por toda parte, no passado, no presente e estará no futuro, só não o ouve que não quer, ou não quer querer. Seja na bravura de Boadiceia liderando um exército de cem mil contra o império romano, seja no sorriso misterioso que Mata Hari deu antes de ser fuzilada, fazendo com que os soldados, para conseguir executá-la tivessem que ser vendados, era linda demais para morrer, e provocante demais para estar viva.
Luz del Fuego.