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A força que nos une: A solidariedade de trabalhadores da educação e do transporte em Paranaguá-PR

Coluna Pão e Pedras: Amenidades e Poesia

Em nossas cidades, quanto mais pobres somos, mais precisamos conviver com aglomerações para garantir o trabalho e a renda que sustenta nossas famílias. Mas existem dois equipamentos urbanos administrados pelo Estado onde os pobres convivem mais precariamente no aperto: no transporte público e na escola. Quem nunca entrou em um ônibus e o encontrou lotado, pessoas apertadas, espremidas, assentos desconfortáveis, motoristas e cobradores cansados, como muitos daqueles que vão e voltam ao trabalho todos os dias? Quem nunca estudou um uma turma de escola estadual e deu de frente com turmas lotadas, onde não há cadeiras e carteiras para todos, não há merenda todos os dias, e os professores, inspetores e agentes de educação estão cansados e mal remunerados? O transporte público e a educação possuem entre si mais relações do que podemos supor em uma observação desatenta.

            Desde 2015, os professores da Rede Estadual de educação paranaense assistem as suas condições de trabalho piorarem ao longo dos anos. São cada vez mais turmas fechadas ano a ano com as reduções de porte das escolas; cada vez mais cheias de gente com a redução do número de turmas, e com cada vez menos tempo de preparar aulas e atividades de qualidade, com a redução das hora-atividades. Neste ano de 2020, iniciamos o ano com uma prova presencial para professores temporários, no meio de uma pandemia e que exclui de cara os professores mais experientes, geralmente parte do grupo de risco para infecções por corona-vírus. Além disso, houve um processo antidemocrático de implantação de escolas militarizadas[1] e com a redução da carga horária por estudante do Ensino Médio das disciplinas de Arte, Sociologia e Filosofia, que trabalham com a reflexão e criação sobre a realidade social.

            Por outro lado, os trabalhadores do transporte do município de Paranaguá estão desde o dia 14 de janeiro em Greve, principalmente para reivindicar seus salários atrasados, que não recebem desde 30 de janeiro da empresa Rocio. Segundo o SINDICAP (Sindicato dos Condutores de Veículos Rodoviários e Anexos de Paranaguá) reivindica-se a melhoria e manutenção dos veículos que estão deteriorados, uniformes adequados ao trabalho, em especial por estarem bastante expostos a contaminação por coronavírus, quitação do banco de horas, regularização dos salários atrasados e parcelados pela empresa. Enquanto estão acampados em frente ao pátio de ônibus da empresa Rocio, são hostilizados por trabalhadores que aguardam no terminal municipal, ao lado da garagem em que acampam, e que tentam se deslocar pela cidade para trabalhar ou realizar algum lazer. Necessitam de doações para amparar as famílias que não tem como se sustentar sem o salário do mês.

            No dia 26 de janeiro, grupos de professores das disciplinas de Sociologia, Arte e Filosofia têm se organizado em todo o Estado sob o nome de Coletivo Humanidades[2], realizando ações para conscientizar a população da não retirada de horas destas disciplinas das escolas da rede estadual. Em Paranaguá, no litoral paranaense, este grupo de trabalhadores da educação se une aos trabalhadores do transporte em uma ação de apoio mútuo e solidariedade, realizando uma atividade de teatro do oprimido onde ocorreu a leitura de trechos de autores e artistas das três disciplinas afetadas, e que terminou com a colagem de cartazes em defesa da educação e do transporte público e de qualidade.

            Neste tempo de pandemia em que vivemos, é importante observar a união entre os trabalhadores destes dois setores – educação e transporte – que vêm sofrendo diversos ataques dos governos federal, estadual e municipal em diversas escalas. Esta solidariedade tem um potencial explosivo, uma vez que são setores que impactam diretamente uma população empobrecida obrigada a se dividir entre salas de aula e ônibus lotados. Quantas famílias estão satisfeitas com a educação e transporte que lhes são oferecidas? É fundamental entendermos o que estes trabalhadores estão sofrendo e lhes oferecer solidariedade na luta, ombro a ombro. Os motoristas da Rocio estão sem salários, os professores estão ficando desempregados, temos uma pandemia e uma crise econômica, o preço dos alimentos, da moradia e do transporte não para de subir. Me parece um cenário bastante importante para valorizarmos ações de solidariedade de classe entre setores diferentes da sociedade que, como trabalhadores, vivem inúmeras misérias cotidianamente nas cidades brasileiras. Afinal de contas, como já nos dizia o geógrafo Milton Santos, em uma das frases lidas pelos trabalhadores da educação e transporte neste dia: “A força da alienação vem dessa fragilidade dos indivíduos, quando apenas conseguem identificar o que os separa e não o que os une.”.

 

[1]     Saiba mais sobre aqui: https://video.rnp.br/portal/audio.action?idItem=93921

[2]     Saiba mais sobre aqui: https://paragrafo2.com.br/2021/01/19/coletivo-de-humanidades-faz-ato-em-todos-os-nucleos-de-educacao-do-parana-contra-a-reducao-de-aulas/

About Kauê Avanzi

Kauê Avanzi é doutorando em Geografia pela FFLCH-USP, educador no Ensino Básico, poeta e músico. Gosta de escrever, se divertir e confraternizar.